Comunicação antirracista é tema de encontro

Nathállia Gameiro 10 de outubro de 2025


Como fortalecer uma comunicação antirracista no Sistema Único de Saúde (SUS)? Com esse mote, a Fiocruz Brasília e o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) realizaram, nos dias 8 e 9 de outubro, o encontro da Câmara Técnica de Comunicação em Saúde, reunindo representantes do Conass, da Fiocruz e das assessorias de comunicação das Secretarias Estaduais de Saúde (SES) de todo o país. O objetivo foi ampliar a visibilidade da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), discutir o racismo estrutural e os desafios para implementação de práticas antirracistas no SUS.

O pesquisador da Fiocruz Brasília, Andrey Lemos, apresentou dados que evidenciam a vulnerabilidade social vivenciada pela população negra no Brasil, incluindo as desigualdades no acesso a cargos de gestão, insegurança alimentar e maior incidência de doenças negligenciadas, como a hanseníase e a anemia falciforme.

Andrey refletiu sobre o papel da comunicação e da sociedade na superação das desigualdades raciais em saúde. Segundo ele, é fundamental compreender que a PNSIPN é resultado de uma trajetória histórica de lutas sociais e políticas e deve ser tratada como uma política estratégica e transversal no SUS.

“Esse trabalho precisa corroborar para o enfrentamento da iniquidade racial na saúde. Vivemos em um país que escravizou milhões de pessoas e que ainda hoje reproduz formas de exploração e exclusão da população negra. Isso impacta diretamente na promoção da saúde, mas também no adoecimento e nas condições de assistência”, destacou.

O pesquisador lembrou que a PNSIPN não é uma política isolada, mas que dialoga com outras políticas nacionais de saúde e com o processo histórico da reforma sanitária e da Assembleia Constituinte, que consolidaram o SUS como um sistema de proteção e seguridade social baseado na dignidade e na equidade.

“A saúde é para cuidar e não para violentar. Talvez o nosso maior desafio seja reconhecer como reproduzimos estereótipos, estigmas e violências no próprio cotidiano dos serviços públicos. É preciso uma formação contínua dos trabalhadores da saúde para compreender a dimensão social e estrutural desses problemas”, completou.

 

Para Andrey, a comunicação não deve ser vista como um apêndice, mas como área estratégica do SUS. “A comunicação precisa estar nesse lugar de centralidade. É por meio dela que conseguimos dialogar com a sociedade, desconstruir estigmas e promover equidade. É preciso pensar em linguagens, narrativas e ferramentas que cheguem à população negra de forma efetiva, sem reduzir o debate apenas a temas de doença ou vulnerabilidade”, reforçou.

Ele destacou ainda a importância do diálogo contínuo com as assessorias estaduais de comunicação, reconhecendo o papel dos comunicadores na transformação das práticas institucionais e no fortalecimento das políticas públicas.

“É um desafio que está colocado. Precisamos facilitar o diálogo, aproximar instituições e reconhecer a comunicação como parte da construção do SUS. É nesse movimento coletivo que fortalecemos a democracia e a saúde pública no Brasil”, concluiu.

O consultor do Conass, Luís Eduardo Batista, reforçou a importância da integração entre as câmaras técnicas do Conselho e a necessidade de uma atuação conjunta para fortalecer a política em todo o território nacional.

“A PNSIPN propõe o uso de indicadores para monitoramento e avaliação, e por isso é essencial o diálogo entre as diretrizes da política e as instâncias técnicas do SUS. A sexta diretriz da PNSIPN, que trata da informação, comunicação e educação para desconstruir estigmas e preconceitos, dialoga diretamente com esta Câmara Técnica. É fundamental que os comunicadores das SES estejam engajados, abrindo espaço para vozes não hegemônicas e fortalecendo a promoção da equidade”, afirmou.

Segundo Luís Eduardo, o compromisso do Conass é fomentar uma ação tripartite efetiva, envolvendo União, estados e municípios, e articular as câmaras técnicas para que a política alcance resultados concretos. “Quando falamos em comunicação, falamos de gestão, de formação e de fortalecimento do SUS. É por meio dessa articulação que poderemos impulsionar a discussão em todos os estados, considerando as especificidades locais e ampliando o alcance das ações de equidade racial na saúde”, completou.

Representando a Fiocruz, participaram ainda Márcia Alves, Rosana Batista, Márcia Corrêa e Castro, Roberta Gondim e Fabiana Mascarenhas. O encontro contou também com a presença de representantes do Hospital Universitário de Brasília.

A professora da Universidade de Brasília (UnB), Valéria Mendonça, ministrou uma aula sobre desinformação em saúde, destacando o risco direto à vida e à saúde pública e estimulando os comunicadores a pensarem novas estratégias de enfrentamento à desinformação nos estados.

Ao final da reunião, os participantes propuseram ações como a produção de vídeos sobre saúde da população negra, a elaboração de nota técnica orientadora, parcerias com universidades e o lançamento do Observatório da População Negra, com o objetivo de apoiar os estados no enfrentamento ao racismo institucional e ampliar a visibilidade da PNSIPN.


Confira aqui o álbum de fotos do encontro.

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