Protagonismo dos usuários de rede de saúde mental é destacado em evento

Fiocruz Brasília 7 de agosto de 2018


Pesquisadores, gestores, profissionais de saúde, acadêmicos e gestores públicos participam do I Congresso da Associação Brasileira de Pesquisa em Prevenção e Promoção da Saúde, que teve início no último domingo (5), na Universidade de Brasília (UnB). A Fiocruz Brasília participa do evento, que tem como objetivo discutir e apresentar estudos de áreas do conhecimento da saúde, em interação com a cultura e as políticas públicas.

A importância da participação do usuário e de diferentes interlocutores como condicionantes para uma boa pesquisa de campo foi destacada por Bárbara Vaz, analista do Núcleo de Saúde Mental Álcool e Outras Drogas da Fiocruz Brasília, durante mesa redonda do evento. “Ouvir os usuários para transformar realidades, essa é a premissa dos nossos projetos. Assim entendemos, de fato, qual é a demanda que está vindo das pessoas que utilizam o serviço”, afirmou. 

Ela citou o lema dos usuários da Rede de Atenção Psicossocial: “Não fale de nós sem nós”. A pesquisadora apresentou dois trabalhos realizados pelo setor, que de acordo com ela, partem da ideia de que para investigar fenômenos e processos grupais e a implementação de políticas públicas, é preciso considerar a participação do usuário no serviço. O foco é nos usuários, no serviço e nos beneficiários do Programa de Volta para Casa, seguindo os princípios da Reforma Psiquiátrica no Brasil. 

A primeira pesquisa apresentada, intitulada “Investigação de barreiras facilitadoras para a promoção do protagonismo dos usuários dos Centro de Atenção Psicossocial (CAPS)”, tem como objetivo descrever as principais barreiras e os facilitadores das ações de fortalecimento do protagonismo e de garantia de direito dos usuários. Bárbara explica a ideia norteadora como olhar para o usuário, para o que ele considera protagonismo e direito dele. 

Entrevistas e observação dos trabalhadores, usuários e familiares e das atividades praticadas foram utilizadas na pesquisa. Está em curso a última fase da pesquisa que consiste na devolutiva dos dados por intermédio de oficinas de discussão, visando construir um plano de ação para potencializar o que os CAPS já fazem. A construção de um acervo de leis, portarias e artigos sobre a saúde mental no Distrito Federal foi um dos produtos da pesquisa. “Basicamente a lei de Saúde Mental do DF e a lei do Dia da Saúde Mental são atos importantes que não são comemorados. Como forma de fortalecer o protagonismo, queremos que o usuário se aproprie dessa legislação”, completa. 

As práticas integrativas – reiki e ioga – foram observadas como promotoras do protagonismo dos usuários por possibilitarem a qualificação corporal e o convívio com a comunidade. As barreiras encontradas foram o desconhecimento do território em que estão inseridos, tendo como ponto de referência apenas o serviço, e a ausência de troca com os gestores para mudanças nos serviços. 

“Implementação do Programa de Volta para Casa (PVC) como estratégia de desinstitucionalização” é a segunda pesquisa realizada em 11 municípios em parceria com pesquisadores de cinco estados. O estudo iniciou na vivência de pessoas vindas de hospitais psiquiátricos em onze cidades: Santos, Campinas, São Paulo, Barbacena, Juiz de Fora, Paracambi, Feira de Santana, Salvador, Camaragibe, Campina Grande e Recife, que participam do PVC desde 2003. O objetivo é analisar o impacto do Programa a partir do itinerário de vida dos beneficiários.

O estudo ouviu os usuários para entender o que o Programa fez na vida de cada um deles. Os relatos são de resgate familiar e autonomia. “Ouvimos várias vezes que os usuários voltaram a ser reconhecidos familiarmente porque passaram a receber um benefício. De alguma forma passou ser um mote para tentativas de resgatar esses laços”, conta a pesquisadora Barbara Vaz. O próximo passo da pesquisa é a prospecção de cenários do que o programa pode fazer nos próximos anos.  

As duas pesquisas adotaram ferramentas que possibilitam maior participação dos usuários, trazendo-os para dentro do Comitê de Acompanhamento de Pesquisa, conforme observou a pesquisadora. O Comitê reúne participantes, gestores, pesquisadores e gestores de serviço para o alinhamento, deliberação e planejamento dos estudos. Ela conta que as discussões são ricas porque é um momento onde o usuário tem condição de se colocar de frente para a gestão e ser escutado. “É uma ferramenta inovadora para pesquisas qualitativas e o instrumento do fazer junto”, completa.  

A mesa redonda também contou com a participação do professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Alex Fraga e a professora da Universidade de Brasília Inês Gandolfo Conceição. 

Temas como políticas públicas e gestão, ensino e educação permanente, redes de colaboração interinstitucionais e pesquisa com populações em situação de vulnerabilidades psicossocial subsidiaram rodas de conversas do evento, que também contaram com a presença de pesquisadores do Núcleo de Saúde Mental.