Estado, Sociedade e Democracia é tema de aula inaugural

Fiocruz Brasília 17 de março de 2017


“Desaprender 8 horas por dia ensina os princípios”. Este trecho do poema Uma didática da invenção, de Manoel de Barros, poeta mato-grossense, foi usado pelo jurista José Geraldo de Souza, para instigar os alunos do Curso de Especialização em Saúde Coletiva à reflexão. No decorrer da aula inaugural, observou que desaprender não é apenas um modo de fazer lugar no cérebro para aprender coisas novas. É um jeito de manter-se sempre em contato com o essencial. É renovar-se, é refazer percepções da realidade.

O professor da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, José Geraldo de Souza, elogiou o projeto do curso de especialização. Disse que contém a preocupação de discutir a naturalização, a radicalização dos processos sociais e políticos que, de alguma maneira, se expressam apenas como dados, reduzindo a realidade social-política. O que considerou instigante, estimulante para o aluno sair da zona de conforto, escapar dos pré-juízos e dos pré-conceitos. Além de necessário quando a conjuntura atual dificulta a capacidade de discernir e impede de refletir sobre a condução de nossa própria ação.

“O mundo não é um mundo dado, mas um mundo construído. Temos de ser partícipes da construção das políticas”, afirmou. Observou ser importante estarmos atentos, analisar e construir debates sobre a configuração dos nossos discursos, muitas vezes excludentes, sobre jovens, mulheres, índios, negros. Os estereótipos, os estigmas, os rótulos que utilizamos nos retratam, por exemplo, quando adjetivamos crianças como trombadinha, menino de ruas, pivete e outros, ou mesmo, apoiamos ações para redução da maioridade penal.

José Geraldo falou do “colonialismo” secular que encontra no social, no político e no econômico seus projetos de poder, de sociedade.  Exemplificou com a “acumulação que arrecada e, egoisticamente, não tem solidariedade com os que trabalham para produzir a riqueza”, o que configura o patrimonialismo, o sexismo, o racismo e que desenharam a formação da nossa sociedade.

Clientelismo, cunhadismo, filhotismo, nepotismo são desenhos categorizados de uma cultura da “troca de favores” que predomina desde a descoberta do Brasil. O Professor lembrou de  Pero Vaz de Caminha, ao final da carta que descreve a “nova terra onde se plantando tudo dá”, ter pedido ao Rei de Portugal favores para seu sobrinho.

José Geraldo disse estar em curso um movimento de desconstrução da Constituição Cidadã, a de 1988, quando uma série de propostas de emenda à constituição (PECs) retiram direitos, privatizam patrimônio da Nação. O movimento alcança a área de saúde com a crescente recuperação das forças de mercado, em detrimento de assegurar recursos para preservação do SUS. O professor disse que que os 35 alunos que começam agora a especialização em saúde coletiva devem estar atentos e refletir sobre o tema.