Covid-19: Fiocruz Brasília conectada com os jovens

Fernanda Marques 24 de abril de 2020


Fernanda Marques

 

Um vírus novo entre seres humanos que chegou a uma grande parte do mundo e está se espalhando na população brasileira, exigindo medidas importantes de contenção, trazendo desafios para o cuidado em saúde mental e provocando muitas dúvidas e reflexões. Conversar com jovens sobre a Covid-19 e seus impactos foi o objetivo do Conexão Fiocruz Brasília realizado na tarde desta quinta-feira (23/4). Durante o programa, estudantes e professores da rede pública do DF apresentaram suas inquietações, acolhidas e comentadas pelos pesquisadores da Fiocruz Cláudio Maierovitch, Débora Noal e Mariella de Oliveira-Costa, e pela bióloga Bélin Poletto Mezzomo, coordenadora da Gerência de Acompanhamento dos Anos Finais da Diretoria de Ensino Fundamental da Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF). As interações também aconteceram por meio do chat no canal da Fiocruz Brasília no YouTube.

 

“A Fiocruz é muito conhecida por suas pesquisas, produção de vacinas etc. Mas ela também tem uma atuação importante na educação básica, voltada para adolescentes e jovens. Este é um público muito especial, junto ao qual precisamos reforçar, mais do que nunca, que o conhecimento da Fiocruz é patrimônio público de todos”, afirmou, na abertura do programa, a diretora da Escola de Governo Fiocruz (EGF/Fiocruz Brasília), Luciana Sepúlveda. Esta edição do Conexão Fiocruz Brasília foi realizada com a parceria da Subsecretaria de Educação Básica do DF.

 

Até quando?

O epidemiologista Cláudio explicou que restringir a circulação de pessoas ajuda a reduzir a circulação do vírus, de modo que, em determinado momento, as atividades poderão ser liberadas, gradativamente, com os devidos cuidados. Entretanto, em outro cenário, a liberação de atividades pode vir a causar, novamente, o aumento do número de casos, exigindo, outra vez, medidas de isolamento e restrições, enquanto não houver uma vacina. “Não há estudos científicos que justifiquem o recuo das medidas de isolamento físico antes que a epidemia esteja controlada. Ela se iniciou a menos de dois meses e ainda está em fase de expansão. Mesmo quando ela atingir a estabilidade, manter a situação estável requer restrições”, disse, lembrando que os impactos negativos atingem, sobretudo, as populações mais pobres e em maior situação de vulnerabilidade.

 

Sobre os números da Covid-19, Cláudio afirmou que existem muito mais casos do que os divulgados. “Isso não significa que os casos estejam sendo ‘escondidos’. Os casos divulgados são os conhecidos e se referem a indivíduos que procuraram os serviços de saúde, fizeram o teste e o exame foi positivo. Mas temos as pessoas que procuraram os serviços e não fizeram o teste, as que não procuraram os serviços e, ainda, pessoas com o vírus e sem nenhum tipo de sintoma, mas que podem transmiti-lo”, justificou.

 

Evidência científica é fundamental

Cláudio comentou que o novo coronavírus não sofre mutações tão rapidamente quanto outros vírus. “Não tem havido mudança em relação à doença que ele causa nem em relação à reação de defesa que ele provoca no organismo do hospedeiro”, disse. Por isso, acredita-se que a infecção pelo novo coronavírus possa deixar uma imunidade que dure por um certo tempo. Acredita-se também que as eventuais mutações possam vir a produzir vírus menos agressivos – porque preservar o hospedeiro é uma vantagem evolutiva.

 

O epidemiologista destacou que, apesar de testes preliminares, até o momento, nenhum medicamento capaz de prevenir a doença ou o agravamento da doença teve sua eficácia e segurança demonstradas cientificamente, processo que envolve várias etapas de estudo. A importância do conhecimento científico para o entendimento do processo saúde-doença e para o enfrentamento da pandemia foi ressaltada pela bióloga Bélin. “As evidências científicas são fundamentais para que tenhamos estimativas confiáveis para orientar os governantes e nortear as políticas públicas”, ponderou.

 

Protagonismo jovem

Segundo Bélin, iniciativas como o programa Conexão Fiocruz Brasília têm tudo a ver com o currículo da educação básica e são importantes oportunidades de acesso ao conhecimento científico e à formação cidadã. “Com esse acesso, e inteirados com as tecnologias para se manifestarem, os jovens têm condições de criticar, opinar, exigir direitos e transformar a realidade”, sublinhou.

 

Para este momento de isolamento, sem aulas, Bélin deixou algumas sugestões para os jovens. “Tem que ter autoconfiança, não pode desistir no primeiro obstáculo. É importante manter uma rotina, separar horários para se dedicar aos estudos, organizar o ambiente e os materiais, criar um cronograma, distribuir as disciplinas e conteúdos ao longo da semana, e fazer intervalos entre os tempos de estudo”, elencou. “Não estudem muitas horas seguidas, intercalem momentos de concentração e relaxamento”, recomendou.

 

Ficar triste é normal

O isolamento não é uma condição normal e, em condições anormais como essa, algumas reações são esperadas, como ficar triste, sentir raiva, não conseguir dormir direito e até ter alguns conflitos com a família e os amigos. “Estamos tensionados. É como se a gente fosse um computador com várias abas abertas ao mesmo tempo. Ele não vai funcionar direito, vai travar. Nós também: vamos sentir medo, tédio, angústia”, comparou a psicóloga Débora.

 

Mas o fato de que essas reações são esperadas não quer dizer que a gente não possa fazer nada a respeito. Pelo contrário. Para buscar um equilíbrio das emoções, deve-se buscar combinar atividades intelectuais, que movimentem o corpo e que alimentem os afetos. “O isolamento é físico, não dos afetos”, lembrou Débora. “O foco deve estar naquilo que gera em você a sensação de proteção e segurança: as pessoas e grupos com os quais você se identifica, assuntos que agradam, atividades que conectam com o presente”, sugeriu. Uma boa estratégia é escrever um diário, onde você registre os dias mais animados e também os momentos ruins: quando você escreve, elabora melhor suas emoções e consegue compreender o que está acontecendo. 

 

Excesso de (des)informação

Estudos apontam que o excesso de informações e as informações desencontradas estão entre as principais causas de angústia durante uma epidemia. Não por acaso as estratégias de estabilização emocional das equipes de saúde passam pela oferta de informações seguras e ancoradas em bases científicas sobre formas de contágio e proteção. “No caso dos jovens, os professores, como figuras de autoridade, têm um papel fundamental de fornecer aos estudantes essas informações”, lembrou Débora.

 

Mas os jovens também têm um papel central nesse processo, especialmente no que se refere ao enfrentamento das fake news. “Sempre existiram informações falsas, mas hoje o volume e a velocidade são muito maiores. Os jovens têm um enorme potencial para atuar como detetives de fake news e virar referência na checagem das informações, contribuindo, assim, para a saúde pública”, destacou a jornalista Mariella. Ela resumiu alguns passos a seguir antes de compartilhar uma mensagem: avaliar a fonte e o autor da informação; verificar se o material tem elementos alarmistas – bastante comuns em notícias falsas; prestar atenção na data de publicação; ler mais do que o título e o subtítulo; se for algo importante, confirmar se outros veículos conhecidos já repercutiram a informação; certificar-se de que não se trata de um site de humor; e atentar para a possível manipulação de imagens.

 

Oportunidades na crise

Na crise atual, faz muito bem cuidar e ser cuidado. Cuida quem checa a mensagem, avisa que é falsa e não compartilha. Existem muitas e variadas de formas de cuidar. “O que você pode fazer com prazer e impacto positivo para outra pessoa ou para um coletivo?”, provocou Débora. Pode ser uma comida especial que você deixa na porta da casa da sua tia; pode ser uma contação de histórias pela internet para entreter os filhos das suas amigas que são mães. “Montar uma rede de afeto e cuidado faz toda a diferença”, resumiu. O momento tem sido bastante difícil, com uma mudança brusca de rotina, sofrimentos e prejuízos para todos. “Nunca vivi nada parecido com isso e tenho aprendido com cada coisa que acontece. Cada um vai tirar disso uma experiência para levar por toda a vida”, acrescentou Cláudio.