Fortalecer os serviços públicos é essencial para evitar xenofobia

Nathállia Gameiro 31 de outubro de 2019


André Freire


O desenvolvimento local, em especial dos serviços de saúde, deve considerar as necessidades das populações que residem nas regiões de fronteira. Pode parecer uma obviedade, mas é algo que ajudaria a evitar a estigmatização dos migrantes e a xenofobia. Esse foi um dos entendimentos dos representantes do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) no Brasil e do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) no Brasil – instituições que compõem a “Operação Acolhida”, acordo de assistência humanitária firmando entre o Governo Brasileiro e as Nações Unidas.

As reflexões sobre migrações foram apresentadas no X Ciclo de Debates sobre Bioética, Diplomacia e Saúde Pública, em 24 de outubro, no auditório interno da Fiocruz Brasília. O representante adjunto do ACNUR no Brasil, Federico Martínez, explicou que o esgotamento dos serviços públicos devido à pressão sofrida pelo aumento na demanda é capaz de estimular o preconceito contra os migrantes. “Muitas vezes, existe a percepção, seja real ou não, de que os migrantes retiram recursos dos próprios nacionais”, disse.

De acordo com a representante interina do UNFPA no Brasil, Júnia Quiroga, a comunidade que acolhe os migrantes será transformada quando a migração resultar no aumento da capacidade dos serviços públicos. Para ela, é importante que os migrantes sejam plenamente integrados às regiões que os acolhem. “Não basta apenas retirar os migrantes de um contexto de emergência, mas sim de atingir a sua integração social e econômica nos novos locais”, afirmou.

Operação Acolhida

Mais de 5 milhões de pessoas deixaram a Venezuela até o momento. O êxodo, considerado o maior da América Latina, tem feito com que países da região se organizem para receber os migrantes da Venezuela. Só o Brasil já recebeu mais de 200 mil venezuelanos. Em média, 450 venezuelanos cruzam por dia a fronteira brasileira em Pacaraima, distante 215 km da capital de Roraima, Boa Vista.

Diante desse contexto, foi criada, em 2017, a Operação Acolhida em Roraima, um acordo de assistência humanitária firmando entre o Governo Brasileiro e as Nações Unidas. “A operação acolhida é um exemplo muito singular de interoperação entre diferentes atores”, sustentou a representante da UNFPA. 

De acordo com Júnia Quiroga, a tentativa é transformar os serviços locais para que as ações de emergência tenham maior sustentabilidade visto que não há previsão para o término da crise na Venezuela. Para isso, são promovidos processos de capacitação dos profissionais de saúde e assistência social, bem como de outros atores da gestão pública local.

Pacto Global sobre Refugiados

Aprovado em 2018, o pacto global sobre refugiados busca promover uma resposta internacional apropriada para os deslocamentos em massa e situações prolongadas de refugiados.

“O pacto é uma resposta da comunidade internacional que pretende reforçar a necessidade da cooperação internacional nos casos de grandes movimentos de refugiados”, disse Martínez. Segundo ele, é essencial adotar a solidariedade internacional como elemento vital para a proteção dos refugiados.

São objetivos do pacto aliviar a pressão sobre os países de acolhimento, aumentar a autossuficiência dos refugiados, ampliar o acesso a soluções adotadas em outros países e apoiar a criação das condições necessárias para o regresso dos refugiados em segurança e dignidade aos países de origem.

Migrantes x Refugiados

Definir quem é um refugiado entre aquelas pessoas que migram entre países é fundamental para proteção daqueles que fogem de perseguição e conflitos armados. Os refugiados necessitam de asilo em outro lugar, porque para eles é muito perigoso voltar aos países de origem. Já os migrantes escolhem se deslocar na busca por melhores condições de vida, seja com relação às oportunidades de trabalho ou educação, por exemplo.

A definição de refugiado é baseada no direito internacional. São marcos jurídicos a Convenção da ONU de 1951 sobre o Estatuto dos Refugiados, Convenção da OUA (Organização da Unidade Africana) e a Declaração de Cartagena de 1984 sobre os Refugiados. Um dos princípios fundamentais estabelecidos no direito internacional é que os refugiados não podem ser expulsos ou devolvidos a situações em que sua vida e liberdade estejam em perigo.

 

Ciclo de Debates – O Ciclo de Debates é promovido pelo Núcleo de Estudos sobre Bioética e Diplomacia em Saúde (Nethis/Fiocruz Brasília). A representação brasileira da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS) apoia a realização das sessões. Acesse as sessões anteriores aqui.