Iris Pacheco (Psat/Fiocruz Brasília)
Durante a COP30, que acontece em Belém (PA), o Programa de Saúde, Ambiente e Trabalho (Psat/Fiocruz Brasília) marcou presença em debates centrais sobre justiça climática e direitos territoriais. Nesta segunda-feira (17), a enfermeira e pesquisadora Francyslane Vitória da Silva, integrante do Psat, coordenou a mesa “A voz da pesca artesanal frente às mudanças climáticas: desafios e mareando para o futuro”. Realizada na AgriZone da Embrapa, o encontro reuniu lideranças que vivem, defendem e produzem ciência a partir dos territórios das águas.
O espaço se consolidou como um momento potente de diálogo e afirmação política, no qual as vozes das comunidades pesqueiras e dos povos das águas ganharam centralidade diante das emergências climáticas que já atravessam seus modos de vida.
As vozes das águas ecoaram seus relatos profundos sobre os impactos das mudanças climáticas em suas comunidades tradicionais, pesqueiras, quilombolas e ribeirinhas. Os participantes discutiram transformações já percebidas nas marés, nos ciclos da natureza, na pesca, na qualidade da água — e, principalmente, na vida das mulheres, jovens e famílias que dependem desses territórios para existir e sobreviver.
Segundo Francyslane, participar da COP30 foi mais que ocupar um espaço: “se trata de reivindicar narrativas, defender direitos, afirmar a existência dos povos das águas e denunciar o racismo ambiental que, há anos, tenta silenciar esses corpos e territórios”, salientou.
A mesa reafirmou que o avanço de grandes empreendimentos, a expansão do capitalismo predatório e a ocupação desordenada dos territórios precisam ser enfrentados com firmeza. As lideranças defendem o direito dos povos de permanecer onde seus ancestrais fincaram história, cultura e vida.
Ainda na segunda-feira, Uine Lopes, do Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil (MPP), participou da mesa “Juventudes Afrodescendentes e Justiça Climática”, também realizada na GreenZone e denunciou a situação emergente sob a qual as comunidades de Ilha de Maré, bairro mais negro de Salvador, forjado em sua maioria por remanescentes de quilombo que vivem da pesca artesanal, da mariscagem e do turismo, está cercado por indústrias e pela crise climática.
“Nós, como moradores do bairro Ilha de Maré, sofremos com a ausência do Estado, o que é potencializado pelo próprio município de Salvador, um espaço feito por pessoas brancas, e que não pensa políticas para a população que sobrevive do território de fato”, relatou Uine.
A participação do MPP neste espaço levou para o centro das discussões da COP30 as pautas quilombolas, periféricas e das águas, conectando raça, território e clima como dimensões indissociáveis. Assim como as demais intervenções populares que aconteceram neste espaço, evidenciou que a COP30 não pode falar de clima sem ouvir quem sente profundamente os efeitos da crise climática.
Para Francyslane, a atuação do Psat articula os movimentos sociais na COP30, reafirma um compromisso institucional com a justiça climática, a saúde dos territórios, a defesa dos povos tradicionais e o fortalecimento das lutas políticas e comunitárias.
“Essa parceria, construída com a ANP [Articulação Nacional das Pescadoras], o MPP, quilombos e juventudes das águas, se expressa no cotidiano das formações, das pesquisas e das ações conjuntas que integram ciência, cuidado e resistência”, completou.
Como parte desse compromisso, o Psat produziu mil exemplares da Carta Aberta dos Povos das Águas no Enfrentamento das Mudanças Climáticas, escrita pela Articulação Nacional das Pescadoras e pela Juventude das Águas. O documento foi distribuído ao longo do evento como expressão política dos territórios na COP30.
Confira na íntegra a Carta Aberta dos Povos das Águas no Enfrentamento das Mudanças Climáticas.