Mostra reúne inovações para saúde e agricultura familiar

Fernanda Marques 17 de junho de 2022


Não precisamos nem devemos aguardar apenas grandes ações, porque várias pequenas ações juntas também mudam o mundo. A reflexão foi feita por José Dias, do Centro de Educação Popular e Formação Social, organização da sociedade civil que trabalha com agricultura familiar no sertão da Paraíba. Ele é responsável por um dos seis projetos apresentados na manhã desta sexta-feira (17/6) na I Mostra Virtual de Soluções para a Saúde, que reúne diferentes trabalhos com foco na promoção da agricultura familiar e no desenvolvimento de territórios saudáveis, sustentáveis e solidários.

 

Outras soluções serão apresentadas neste sábado (18/6), das 10h às 12h. Os interessados podem acessar a sala virtual da plataforma Teams neste link.

 

A Mostra faz parte da 5ª Feira de Soluções para a Saúde, organizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em parceria com a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). A Feira de Soluções, por sua vez, integra a I Feira Nordestina da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Fenafes), que ocorre até domingo (19/6) no Centro de Convenções de Natal (RN). Além da programação presencial no Centro de Convenções, a Feira de Soluções inclui duas atividades on-line: a Hackathona do Campo à Cidade e a Mostra Virtual.

 

Em sua apresentação, José Dias falou de um sistema de horta orgânica com economia de água, experiência já compartilhada com mais de 500 agricultores familiares. “Esse encontro de saberes locais representa uma possibilidade real de mudança, inspirando outras pessoas a desenvolverem soluções para a convivência com o semiárido brasileiro”, afirmou. Outro projeto relacionado à otimização do uso da água foi apresentado por Maxmüller Fernandes, de uma startup de soluções ambientais localizada no Ceará. “Menos de 30% das residências rurais estão conectadas à rede de água”, destacou o engenheiro ambiental, enquanto descrevia um sistema de monitoramento remoto, em tempo real, de sistemas hídricos em áreas rurais. Um dos diferenciais do sistema é monitorar não só a quantidade de água nos reservatórios, mas também sua qualidade, contribuindo para uma melhor gestão dos recursos disponíveis.

 

Estratégias de produção e distribuição de alimentos também foram destacadas durante a Mostra. A engenheira florestal Gabriela Tejerina apresentou a Feira Interinstitucional Agroecológica, projeto de extensão do Instituto Federal de Goiás (IFG), Instituto Federal Goiano (IF Goiano) e Universidade Federal de Goiás (UFG). Realizada mensalmente, a Feira aproxima produtores familiares e quilombolas de consumidores, assegurando geração de renda e alimentação saudável – inclusive com valorização de alimentos do cerrado. Há frutas, verduras e produtos minimamente processados, como polpas e geleias. “Mas esses produtores estão sendo muito pressionados pelo agronegócio”, lamentou Gabriela. Ela comentou também os desafios de manter o projeto no período pandêmico, o que exigiu uma série de cuidados no transporte e comercialização, como atendimento dos consumidores com hora marcada para evitar aglomerações.

 

Já a mestranda da Fiocruz Pernambuco Suzany Silva trouxe a experiência da Rede de Comunidades que Sustentam a Agricultura na Parahyba, que possibilita acesso à comida saudável, sem agrotóxico, a partir da produção de agricultores quilombolas. “O brilho, o vigor e o sabor dos alimentos são totalmente diferentes por serem orgânicos”, assegurou Suzany. Mas os benefícios da Rede não param por aí. “De um lado, as pessoas na Comunidade têm assegurado que vão receber alimentos orgânicos; do outro, agricultores familiares têm garantido que vão receber pagamento. É um processo construído com base na confiança que revoluciona a relação do campo com a cidade na aquisição de alimentos, sem atravessadores”, definiu.

 

A Mostra trouxe ainda projetos da Associação Norte-Rio-Grandense de Engenheiros Agrônomos (Anea) e da Agência de Defesa e Fiscalização Agropecuária de Pernambuco (Adagro). Da Anea, Silvana Fernandes apresentou o Projeto Vale Sustentável, que realiza ações em comunidades e assentamentos de quatro municípios do Rio Grande do Norte, recuperando mais de 150 hectares de áreas degradadas com cerca de 55 mil mudas nativas. Paralelamente, há ações de educação ambiental; quintais produtivos, onde se cultivam hortaliças e plantas medicinais; segurança alimentar, inclusive por meio do fortalecimento da merenda escolar; e, ainda, limpeza de rios.

 

Da Adagro, Jurandir Barbosa comentou os resultados de um projeto de combate ao descarte irregular de embalagens vazias de agrotóxicos no município de São Vicente Ferrer, na Zona da Mata de Pernambuco. Com vistas à aproximação do pequeno produtor e à melhoria do serviço prestado à população, foram realizadas visitas às propriedades para sensibilização sobre a importância da correta devolução das embalagens. “Muitos desconheciam a obrigatoriedade de devolução e queimavam ou enterravam as embalagens, um descarte irregular que gera riscos à saúde e ao meio ambiente”, contou. Durante as visitas, também foi constatado o desconhecimento sobre normas de segurança para armazenamento e aplicação dos produtos, além de uso sem necessidade comprovada. “Como resultado, quase 900 quilos de produtos tóxicos foram retirados do meio ambiente, além da conclusão de que é necessário organizar ações de educação ambiente e incentivo à agricultura orgânica”, apontou Jurandir.

 

Políticas públicas para a vida

Profissionais da Fiocruz e da Contag acompanharam as apresentações da I Mostra Virtual de Soluções para a Saúde. Para Wagner Martins, coordenador do Colaboratório de Ciência, Tecnologia, Inovação e Sociedade da Fiocruz Brasília, o objetivo é transformar o atual modelo agrário para um sistema mais saudável, sustentável e solidário. “Por meio da parceria com a Contag, queremos levar para os territórios da agricultura familiar a saúde pública de qualidade e dar visibilidade aos muitos saberes que existem nesses territórios. Porque saúde não é só assistência, é também produção e acesso a alimentos saudáveis. Precisamos de políticas públicas que unam o campo e a cidade para garantir maior qualidade de vida para as pessoas”, disse.

 

O coordenador de Relações Institucionais da Fiocruz, Valcler Rangel, reforçou a urgência de fazer frente ao problema da fome, que atinge 33 milhões de brasileiros. “Não adianta ficarmos nos nossos gabinetes, temos que estar junto com os movimentos que representam a população, na ponta, buscando parcerias e soluções reais. Só vamos encontrar soluções adequadas a cada território se estivermos juntos com as organizações desses territórios”, frisou o também coordenador da iniciativa IdeiaSUS.

 

De acordo com Antônio Lacerda Souto, assessor de políticas sociais da Contag, a pauta da saúde é prioridade para o desenvolvimento, mas não podemos conceber esse desenvolvimento sem o tripé da sustentabilidade social, sustentabilidade ambiental e economia mais inclusiva. “É preciso uma nova economia, de base solidária, que inclua os agricultores familiares e os pequenos produtores das periferias urbanas também. Não vamos ter saúde com fome e meio ambiente degradado, onde o agronegócio enche de veneno nossas lavouras e os lençóis freáticos”, afirmou.

 

As soluções apresentadas mostraram as mulheres como protagonistas da agricultura familiar e a pauta dessas mulheres rurais foi reforçada por Elaine Nascimento, da Fiocruz Piauí. “Construímos soluções porque temos disposição para lutar, esperançar e avançar para um futuro mais saudável, sustentável e solidário. E, no centro dessa construção, estamos nós, as mulheres. Temos que lutar contra os racismos, as violências e as violações que as mulheres do campo sofrem”, destacou.

 

Também participaram Alexandre Pessoa, da Escola Politécnica de Saúde da Fiocruz, que divulgou o Dicionário de Agroecologia e Educação, e Jorge Machado, coordenador do Programa de Promoção da Saúde, Ambiente e Trabalho da Fiocruz Brasília, que apresentou projetos de vigilância popular em saúde de base territorial e integrada nos estados de Piauí, Ceará, Bahia, Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Pernambuco. “São projetos que trabalham com informação contextualizada para a ação participativa”, resumiu.

 

Alexandre e Jorge participam neste sábado (18/6), das 14h às 18h, da oficina presencial “Vigilância popular em saúde e caminhos das águas, dos alimentos e das pessoas”, no Centro de Convenções de Natal (RN).

 

Clique no vídeo abaixo para saber como foi o primeiro dia da Mostra. 

 

 

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