Fala aê, mestre: a tecnologia e o acesso à saúde

Fernando Pinto 28 de maio de 2021


Com o isolamento social provocado pela pandemia do novo coronavírus, houve um aumento significativo no uso de tecnologias para conversas, aulas e mesmo consultas médicas. Em março de 2020, o Ministério da Saúde regulamentou, em caráter emergencial, a telemedicina. O recurso, mais seguro para a saúde de médicos e pacientes neste momento, contribui para diminuir a circulação de pessoas e a sobrecarga nas unidades de saúde. 

 

Com o objetivo de conhecer o custo-benefício da adoção de recursos tecnológicos para o atendimento a distância em saúde, Jetro Willams, egresso do Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde da Fiocruz Brasília, realizou um estudo sobre a implantação do serviço de telediagnóstico em cardiologia em municípios de difícil acesso. O pesquisador analisou esse serviço em cinco municípios do estado do Acre que, durante o ano de 2018, utilizaram o serviço de telediagnóstico, comparando os resultados caso os mesmos procedimentos tivessem sido realizados presencialmente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

 

O telediagnóstico utiliza as tecnologias da informação e comunicação para realizar serviços de apoio ao diagnóstico através de distâncias geográfica e temporal. Em outras palavras, é a realização de laudo a distância para apoio ao diagnóstico em diferentes especialidades médicas. A principal vantagem da utilização do telediagnóstico está na melhoria do acesso, especialmente para moradores de locais distantes dos grandes centros urbanos. Conheça mais sobre o serviço de telemedicina e os resultados do estudo na entrevista da semana da coluna de divulgação científica “Fala aê, mestre”.

 

Para quais doenças o serviço de telediagnóstico é utilizado no SUS? 

Jetro Willams: O telediagnóstico é utilizado como serviço de apoio ao diagnóstico nas especialidades de cardiologia, oftalmologia e dermatologia, em oito estados da federação e com a perspectiva de expansão para os demais estados, além da inclusão de novas especialidades, como pneumologia e radiologia.

 

Quais são os exames mais comuns realizados via atendimento remoto?

Jetro Willams: Os exames que podem ser realizados hoje no atendimento remoto são: eletrocardiograma (que avalia o ritmo dos batimentos cardíacos em repouso), retinografia (que consiste em observar e registrar fotografias da retina, do nervo óptico e do fundo do olho), exames de imagem em dermatologia, espirometria (que mede o volume e a velocidade com que o ar entra e sai dos pulmões a cada respiração), raio x, tomografia (uma espécie de raio-x mais detalhado), eletroencefalograma (que registra a atividade elétrica do cérebro), ecografia (que se baseia no eco para gerar imagens das estruturas internas do organismo) etc. No Brasil, há registros de que já foram realizados os cinco primeiros exames listados, isto é, eletrocardiograma, retinografia, exames de imagem em dermatologia, espirometria e raio-x.

 

Quais os benefícios para o usuário na adoção dos serviços de telediagnóstico?   

Jetro Willams: O usuário é o maior beneficiário deste serviço, com ganhos efetivos de qualidade do atendimento, otimização do tempo, equidade da atenção à saúde e economicidade, uma vez que o telediagnóstico evita grandes deslocamentos, atendimentos precários e tempo gasto em filas de espera de hospitais, em especial neste momento em que o isolamento social se faz necessário.

 

Um laudo de exame realizado a distância é confiável?

Jetro Willams: Sim, ele é confiável, porque é acompanhado por um profissional médico especialista credenciado e segue os mesmos parâmetros do laudo emitido no exame presencial. Graças ao avanço da tecnologia, esses laudos são submetidos a padrões de imagens e gráficos que conferem confiabilidade aos exames.

 

Em sua pesquisa, você analisou o custo-benefício do serviço de telediagnóstico em cardiologia em cinco municípios no Acre. Quais foram os resultados desse estudo? 

Jetro Willams: Meu trabalho mostra que o custo do laudo de eletrocardiograma via telediagnóstico, no Acre, em 2018, foi cerca de três vezes mais barato, quando comparado ao serviço tradicional. Experiências em outros países apontam que esse serviço pode ser até oito vezes mais econômico do que o tradicional. O custo do laudo de eletrocardiograma presencial foi aferido em dois cenários hipotéticos: o primeiro com o deslocamento até a capital do estado e o segundo com o deslocamento até o centro metropolitano mais próximo, onde houvesse oferta do exame. Em média, nos cinco municípios analisados, o serviço tradicional custou R$ 54,53. Já o custo do telediagnóstico foi igual a R$ 17,04, valor decomposto em R$ 4,22 referente à implantação, R$ 7,80 à manutenção e R$ 5,02 à contrapartida do município. Ainda segundo os dados analisados em minha pesquisa, cinco estados do Brasil já adotaram o telediagnóstico em cardiologia e oito estados já aderiram a esta ou outras especialidades ofertadas.

 

Com o cenário da pandemia de Covid-19, houve alguma readequação do sistema para auxiliar na demanda por esses atendimentos?  

Jetro Willams:  O artigo “Desafios e oportunidades para telessaúde em tempos de pandemia pela Covid-19”, publicado em junho do ano passado nos Cadernos de Saúde Pública, menciona 12 iniciativas tomadas pelo programa Telessaúde Brasil Redes para o enfrentamento da pandemia de Covid-19, como a criação de um chat interativo, um espaço para apuração de fake news e espaços para divulgação de boletins epidemiológicos. A íntegra do artigo pode ser acessada aqui.

 

Jetro Willams Silva Junior é autor da dissertação “Análise de Custo-Benefício do Serviço de Telediagnóstico em Cardiologia no Acre”, defendida em 31 de março de 2020, com orientação do professor Everton Nunes.

 

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