Fala aê, mestre: cuidados paliativos, formação do enfermeiro e o SUS

Fernando Pinto 21 de abril de 2023


Com o objetivo de analisar a percepção dos educadores de cursos técnicos em enfermagem sobre o desenvolvimento de objetivos educacionais voltados para os cuidados paliativos e a educação para a morte, a enfermeira Hévane Virgínia dos Santos, egressa do Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde da Fiocruz Brasília, realizou um estudo sobre a interface entre a formação profissional em enfermagem e a atuação no Sistema Único de Saúde (SUS).

 

Segundo Hévane, é necessário que todos os atores envolvidos tenham a capacitação necessária para a atuação nos espaços da assistência e da arena política, para que os cuidados paliativos possam, de fato, se configurar como uma política pública consolidada no SUS. Em sua pesquisa, ela observou que os educadores reconhecem o processo educativo como insuficiente para o cuidado às pessoas que estão morrendo, embora considerem a formação dos futuros técnicos de enfermagem essencial para o aprimoramento desta temática no SUS.

 

Ao ouvir esses educadores, Hévane observou uma relação entre os significados que eles construíram acerca da morte e as suas escolhas profissionais, bem como uma relação entre esses significados e suas aproximações com o ensino da educação para a morte e os cuidados paliativos. Apesar de reconhecerem a importância da enfermagem nos cuidados paliativos no SUS, os docentes ainda têm dificuldade de atuarem como facilitadores da aprendizagem dos futuros profissionais sobre essas temáticas. Leia mais sobre o trabalho na entrevista da semana da coluna de divulgação científica “Fala aê, mestre”.   

 

O que são cuidados paliativos?  

Hévane dos Santos: Os cuidados paliativos deixaram de ser um cuidado voltado àqueles para quem “nada mais pode ser feito”. Porém, essa é uma ideia que foi ampliada. Em 2017, a International Association for Hospice and Palliative Care (IAHCP) se posicionou no entendimento de que os cuidados paliativos são direcionados às pessoas com doenças graves, enquanto a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2018, acrescentou que se direcionam aos que convivem com quadros que ameacem a vida. Deve-se controlar os sintomas, garantir a autonomia e promover a qualidade de vida daqueles que estejam vivenciando esses agravos em sua saúde. E os familiares fazem parte desse cuidado.

 

Quais os tipos de cuidados paliativos? 

Hévane dos Santos: Os cuidados paliativos podem ocorrer de forma concomitante ao tratamento que busca reverter a doença grave. Podem também ocorrer de forma exclusiva, com o objetivo de controlar sintomas e promover higiene, conforto, autonomia, qualidade de vida e outros aspectos importantes para a condição de vida da pessoa cuidada, não havendo mais, nesse caso, o objetivo de curar a condição de saúde grave e ameaçadora da vida que trouxe a pessoa para os cuidados paliativos.

 

Quando o paciente entra em cuidados paliativos? E onde ele pode receber esses cuidados?

Hévane dos Santos: A pessoa com um diagnóstico de doença grave e que ameace sua vida, bem como sua família, deve começar a receber os cuidados paliativos imediatamente após esse diagnóstico, minimizando os sofrimentos causados pela doença e garantindo a qualidade de vida durante todo o tratamento, independentemente do desfecho de cura, condição crônica ou morte. Os cuidados paliativos são oferecidos em todos os pontos da Rede de Atenção à Saúde do SUS: Atenção Primária; Atenção Domiciliar; Ambulatórios Especializados; Urgência e Emergência e Hospitais; e nos Hospices, um serviço pensado especialmente para oferecer esse tipo de cuidado.

 

Qual o papel dos cuidados paliativos no SUS? 

Hévane dos Santos: Os cuidados paliativos se comunicam diretamente com a garantia do princípio da integralidade do SUS. Os seres humanos devem ter sua vida e suas necessidades de saúde cuidadas em todas as fases, desde a gestação até o pós-morte. As pessoas devem ter igualdade no acesso aos cuidados e não devem ser discriminadas quando, em uma condição de doença grave e com risco de morrer, deixam de contribuir para os objetivos do mercado de trabalho e do capitalismo. Essa é uma lógica que propõe um novo olhar para os cuidados em saúde, retirando a doença da centralidade e permitindo ao SUS uma nova forma de entender o ser humano em sua totalidade e em sua singularidade.

 

Quem são os profissionais envolvidos em oferecer os cuidados paliativos?

Hévane dos Santos: Os cuidados paliativos devem ser prestados por uma equipe multidisciplinar, com equipe de enfermagem, médicos, psicólogos, nutricionistas, assistentes sociais, odontólogos, terapeutas ocupacionais, farmacêuticos, fonoaudiólogos e profissionais de educação física, bem como com pessoas que possam proporcionar um cuidado espiritual. Essa ação integrada é o que permitirá que toda a complexidade e a individualidade de cada ser humano sejam contempladas nos cuidados paliativos.

 

Hévane Virgínia dos Santos é autora da dissertação intitulada “Educação para a morte e cuidados paliativos: uma interface entre a formação profissional em enfermagem e a atuação no Sistema Único de Saúde”, aprovado em 24 de agosto de 2022 no Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde, da Escola de Governo Fiocruz – Brasília, sob a orientação da professora Ieda Maria Avila Vargas Dias.

 

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