Fala aê, especialista: Práticas Integrativas em Saúde no ambiente escolar

Fernando Pinto 19 de novembro de 2021


O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece, de forma integral e gratuita, 29 procedimentos de Práticas Integrativas e Complementares (PICS) à população. Em 2006, foi instituída a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), que aos poucos inseriu no SUS esses procedimentos, que envolvem recursos terapêuticos diversos e vão além da assistência nas unidades de saúde.

 

Compreender como as PICS se relacionam nos vários campos de atuação do SUS, em especial no ambiente escolar, foi o objetivo de uma pesquisa realizada pelo publicitário Gustavo Pozzobon de Albuquerque Lima, que analisou a experiência de implantação de algumas PICS, em especial a Terapia Comunitária Integrativa, em uma escola do Distrito Federal, na Região Administrativa do Gama. Os resultados foram apresentados em seu trabalho de conclusão do Curso de Especialização em Saúde Coletiva da Fiocruz Brasília.

 

Nesta entrevista da série “Fala aê, especialista”, Pozzobon comenta os diferentes aspectos do seu estudo e como ele contribui para reforçar as PICS no ambiente escolar.

 

O que são Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS)?  

Gustavo Pozzobon: A pesquisadora Madel Luz estabelece as PICS como sistemas médicos complexos e recursos terapêuticos com abordagens que buscam estimular os mecanismos naturais de prevenção de agravos e recuperação da saúde, por meio de tecnologias eficazes e seguras, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento do vínculo terapêutico e na integração do ser humano com o meio ambiente e a sociedade. No Brasil, temos uma Política Nacional de PICS que delimita quais são essas práticas. São 29 listadas até hoje e, por mais que haja outras correlatas e algumas divergências, para serem denominadas PICS precisam estar referendadas na Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC).

 

Você estudou a implementação das PICS em uma escola. O que constatou? 

Gustavo Pozzobon: Constatei que projetos desenvolvidos de forma articulada, como as redes sociais o são, com intersetorialidade, humanização e afetividade, têm potencial para resgatar da invisibilidade e da imobilidade princípios presentes nas políticas públicas. Assim, o SUS também depende da qualidade dos encontros e iniciativas com livre circulação entre setores. No estudo, além das articulações, foi observado que servidoras e servidores propuseram práticas contra-hegemônicas no dia a dia da intersetorialidade entre saúde e educação, fugindo de pretensas delimitações. Os estudantes envolvidos ressignificaram para si o que é educação e saúde: o processo educativo todo é uma forma de cuidar.

 

Como inserir PICS em ambientes escolares?

Gustavo Pozzobon: No caso específico, foi preciso um trabalho intersetorial para colocar o projeto em prática, entre a Saúde e a Educação do Distrito Federal. Mais do que isso: entre indivíduos que ocupavam estes espaços de atuação, conhecedores de políticas públicas e PICS caras ao projeto. Outros entes da comunidade em que se insere a escola e a UBS também estiveram presentes nas ações, além de trabalhadores e voluntários de institutos e organizações sociais e a própria comunidade escolar. Processos contínuos de sensibilização, envolvimento e formação foram etapas imprescindíveis.

 

Quais são as dificuldades encontradas na implantação das PICS nas escolas?

Gustavo Pozzobon: Foram identificados o desinteresse de profissionais em fazer formações e trabalhar intersetorialmente; discriminação, preconceito ou rejeição às PICS; entes do corpo docente adoecidos ou desmotivados no trabalho; incompreensão do espaço escolar como sendo também um espaço de saúde; falta inicial de espaços para as práticas nas escolas; os estigmas que afetam, desmotivam e desencorajam pessoas que vivem em lugares periféricos; pouca presença do poder público; contexto de pobreza (estudantes sem acesso a itens básicos de higiene, por exemplo); e fragilidade do projeto com a rotatividade de pessoas envolvidas.

 

Quais políticas mais contribuíram para a implementação das PICS na escola?

Gustavo Pozzobon: De destaque, temos as políticas nacionais da Atenção Básica (PNAB), de Promoção da Saúde (PNPS) e de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), e o Programa Saúde na Escola (PSE). Em seus documentos, há base para trabalhar a escola como um espaço de saúde e, de fato, houve uma integração de ações entre a escola, a Coordenação Regional de Educação do Gama, a Gerência de Práticas Integrativas em Saúde (GERPIS) e a UBS de referência local. A Política Nacional de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) embasou as formações em PICS para que essas práticas pudessem ser oferecidas no espaço escolar. As redes sociais são transversais a estas políticas, assim como a Política Nacional de Humanização (PNH), que contribui com a concepção de que trabalhadores e gestores são capazes de transformar realidades, com autonomia e corresponsabilização quanto ao acesso de qualidade pela população aos serviços públicos.

 

Gustavo Pozzobon de Alburquerque Lima é autor da pesquisa “Práticas Integrativas em saúde na escola: uma implementação de política pública”, apresentada como trabalho de conclusão do Curso de Especialização em Saúde Coletiva da Fiocruz Brasília, com orientação da professora Tatiana Oliveira Novais.

 

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