Saúde de trabalhadores da agricultura em pauta

Fiocruz Brasília 27 de julho de 2018


29 milhões de pessoas moram em áreas consideradas rurais e cerca de 19 milhões trabalham na agricultura no Brasil. Esses dados foram apresentados na sexta-feira, 27 de julho, durante mesa redonda sobre a saúde do trabalhador e da trabalhadora na agricultura, no Abrascão.

De acordo com o pesquisador da Fiocruz Ceará Fernando Carneiro, as populações do campo, floresta e águas são historicamente “invisíveis” e se constituem um empecilho ao modelo de desenvolvimento que visa à exploração da natureza, a apropriação da terra e a privatização da água por grandes empreendimentos. 

O conceito de campo, floresta e águas foi classificado pelo pesquisador como um desafio para quem trabalha com a saúde do trabalhador rural. Para ele, o trabalho rural agora tem novas perspectivas, que considera os biomas, modos de vida e o que querem ser preservados frente ao desenvolvimento. 

A população do campo, floresta e águas inclui camponesas, agricultor familiar, assalariados, quilombolas, extrativistas, ribeirinhos e comunidades tradicionais. “Eles são invisíveis porque alguns dados de mortalidade e de doenças não fazem a diferenciação de urbano e rural, o que dificulta a atuação da vigilância”, explica Ferreira.  

Eles enfrentam problemas no acesso ao saneamento básico, ausência de dados, transporte e educação. Apenas 18% da água utilizada nos domicílios rurais provêm da rede de distribuição, os outros captam a água de poços, nascentes ou outras fontes. A porcentagem de pessoas sem banheiro no meio rural chega a 24% e a do meio urbano a 3%. O escoadouro do banheiro, em 37% dos domicílios ocorre de maneira inadequada, ou seja, os dejetos são despejados nas fossas rudimentares, em valas, direto para o rio, lago ou mar. Todo esse cenário de sistema de saneamento deficitário favorece o surgimento de doenças. 

A comunicação também é um desafio. Carneiro conta que há casos de pessoas que perdem o atendimento de saúde porque o profissional não consegue contato por telefone, já que o aparelho não funciona no local. Há ainda a tripla carga de exposição ao agrotóxico: no alimento, trabalho e onde vivem. Estudos da Fiocruz mostram cada dólar gasto na compra de agrotóxicos pode custar aos cofres públicos 1,28 dólar em futuros gastos com a saúde de camponeses intoxicados. Há ainda problemas com a reforma agrária, agroecologia, fiscalização, vigilância da violência no campo e apoio à vigilância. 

Os dados são da pesquisa realizada pelo Observatório da Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo, da Floresta e das Águas (OBTEIA) e coordenada pelo pesquisador. O Observatório foi criado para avaliar a política e contribuir para sua implantação por meio de uma Teia de Saberes e Práticas, que envolve movimentos sociais do campo, da floresta e das águas, gestores e trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) e a academia. O relatório apresenta dados sobre a saúde bucal, da criança, da mulher e do trabalhador e os agravos para a saúde pública. 

“Precisamos criar e aprender muito com a população dos campos, águas e florestas. Precisamos fazer pesquisa com eles e não apenas sobre eles. Construir junto e aprender com esses movimentos, atendendo às suas necessidades”, ressaltou Carneiro.

Rural x urbano
Carneiro classificou o critério para a definição oficial da população rural como impreciso e influenciado pela questão tributária. “O rural é muito maior do que se imagina”, defendeu Ferreira.  O Maranhão é o estado brasileiro que possui maior percentual de população residente em área rural, com 36,92%. O Distrito Federal apresenta o menor percentual com 3,42%. 

O pesquisador explicou que em 2017 o IBGE propôs uma discussão sobre os critérios de classificação dos espaços urbanos e rurais para subsidiar a implementação de políticas públicas e o planejamento do país. Por essa metodologia, a população urbana do Brasil passa de 84,4% para 76% e a rural passa de 15% para 64% – com destaque para as regiões Norte, Nordeste e Sul do Brasil. Os espaços seriam classificados pela densidade demográfica, localização em relação aos principais centros urbanos e tamanho da população. Pelos critérios atuais, o espaço urbano é determinado por lei municipal, sendo o rural definido por exclusão à área urbana.

Participaram da mesa o pesquisador do Programa de Promoção da Saúde, Ambiente e Trabalho da Fiocruz Brasília Jorge Machado, a representante dos movimentos sociais Ivi Tavares e a representante do Ministério da Saúde Karla Freire.