Inovações do campo à mesa

Nathállia Gameiro 20 de junho de 2022


 

Soluções concretas para resolver problemas reais das pessoas que vivem nos territórios. Assim o coordenador do Colaboratório de Ciência, Tecnologia, Inovação e Sociedade (CTIS) da Fiocruz Brasília, Wagner Martins, definiu as inovações apresentadas durante a I Mostra Virtual de Soluções para a Saúde, atividade que reuniu diferentes experiências sobre a agricultura familiar e outras iniciativas que conectam o campo e a cidade.

 

A Mostra integrou a programação da 5ª Feira de Soluções para a Saúde, iniciativa da Fiocruz em parceria com a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). Confira aqui as soluções apresentadas no primeiro dia da Mostra Virtual. Durante o segundo dia do evento on-line, realizado neste sábado (18/6), foram apresentados mais seis trabalhos.

 

Existem mais de 33 milhões de pessoas com fome no Brasil, sobretudo famílias das regiões Nordeste e Norte. Com o objetivo de ajudar a mudar esse cenário e atender famílias de 10 municípios do Rio Grande do Norte (RN) com indicadores críticos de vulnerabilidade social, foi criada a Bodega Solidária. A iniciativa de alimentação e nutrição desenvolvida pelo Serviço de Assistência Rural e Urbano busca combater a fome e o desperdício de comida pela reintrodução de alimentos na cadeia de abastecimento, além de promover a educação alimentar e nutricional de mais de 850 famílias de baixa renda e em situação de extrema pobreza, famílias numerosas e chefiadas por mulheres, e as que pertencem aos segmentos dos povos e comunidades tradicionais. “Essas pessoas vivem de doações e estão fora de programas que permitem acessar políticas de transferência de renda”, detalhou o representante do projeto, Jean Pierre, da Arquidiocese de Natal. Todas as famílias passam por formação para a criação de quintais produtivos, além de capacitação no campo da nutrição, saúde e direitos humanos, e recebem kits com alimentos da agricultura familiar, da pesca artesanal e de economia solidária.

 

Para o uso saudável e sustentável do território na promoção da saúde, na soberania alimentar e na geração de renda, a Fiocruz e a Contag realizam o projeto “Gênero, quintais produtivos e desenvolvimento territorial saudável, sustentável e solidário” em municípios do Piauí, Goiás, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Nessas regiões, estão sendo realizadas oficinas com o objetivo de ativar redes para o desenvolvimento local, com lideranças sociais, sindicatos, agricultores familiares e povos indígenas. É realizada a escuta do território para a valorização dos saberes locais e das práticas populares em saúde desenvolvidas por agricultoras familiares, assim como o mapeamento de riscos e potencialidades do território. O próximo passo é a implantação de uma Sala de Cooperação Social para monitorar e avaliar as condições de vida a partir do olhar dos(as) moradores(as), gerando dados para formulação de políticas públicas, como explicou Iony Cunha, do Colaboratório de Ciência, Tecnologia, Inovação e Sociedade da Fiocruz Brasília.

 

O foco na comunidade também é visto no projeto Quintais Produtivos, Agroecologia e Segurança Alimentar no Vale do rio Guará, em São Desidério (BA), apresentado por Mário Alberto dos Santos, professor da Universidade Federal do Oeste da Bahia. Mais de 35 famílias já foram beneficiadas com oficinas pedagógicas sobre políticas públicas, compostagem para insumo agrícola e instalação e manejo de sistemas agroflorestais, buscando-se a melhoria do nível de segurança alimentar e nutricional. “Enfrentamos longos períodos de seca na região, o que dificulta a produção. Com a aquisição de equipamentos para o manejo e a fabricação de polpa de frutas congeladas e biocosméticos, as famílias hoje conseguem produzir durante todo o ano. Ter adquirido sistemas de irrigação e utilizado a energia solar aumentou a capacidade de produção”, explicou o professor.

 

Valorização das populações

A Central de Cooperativas Copacaju reúne sete cooperativas singulares do Ceará e possibilita que pequenos produtores de caju de 828 famílias se tornem gestores de seus próprios negócios, processando o caju em minifábricas e comercializando seus produtos. Juntas, as cooperativas geram 30 mil quilos de amêndoas de castanhas de caju, vendidas para dentro e fora do Brasil, principalmente para a Itália. “É uma forma de dar oportunidade e ampliar os horizontes para esses pequenos agricultores que vivem em locais tão pequenos e isolados, para que possam vender e expandir seus negócios. Levamos os produtos para as mesas dos brasileiros e para o mundo”, ressaltou Nubiane Maia, representante da Central.

 

A valorização de populações invisibilizadas é o foco de mais dois projetos apresentados durante a Mostra Virtual. A primeira é a Feira Cultural Rua Viva, que acolhe pessoas que queiram partilhar uma iniciativa econômica, com artesanato local e indígena, comidas típicas e agricultura familiar. A Feira ocorre todo segundo sábado do mês em uma praça de Ilhéus (BA) e reúne mais de 50 expositores, possibilitando parcerias com instituições formadoras. Para André Luis Freitas, o projeto é a reavaliação da praça como um lugar de integração, saúde e valorização das pessoas, e a garantia de um espaço social para que elas possam se manifestar, interagir e ser acolhidas.

 

A outra solução apresentada é o “Participatório de saúde e ecologia de saberes: uma experiência de Vigilância Popular da Saúde, Ambiente e Trabalho”, iniciativa da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), que busca diminuir a invisibilização das populações do campo, floresta e águas, além de apoiar a construção de uma vigilância popular. O foco é no protagonismo popular, na articulação entre saberes científicos e tradicionais, na produção de tecnologias sociais e participativas, e na interação dos movimentos e coletivos populares com o SUS, academia e outros setores, conforme explicou Felipe Bagatoli. A experiência é realizada em municípios do Ceará, Amazonas, Maranhão, Mato Grosso, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, com compartilhamento de tecnologias sociais e colaboração entre os movimentos.

 

Para o coordenador de Integração Estratégica da Fiocruz Brasília, Wagner Martins, a Mostra Virtual apresenta a potência do Brasil, principalmente do Nordeste, e o campo como um ambiente de formação social, econômica e solidária, e de construção de um ambiente com mais saúde e sustentabilidade. “Essas pessoas são o motor do Brasil e do desenvolvimento do nosso país. Para isso, elas precisam estar com saúde, e saúde é vida, economia, ambiente e tudo o que a gente tem e precisa ter. Saúde não é apenas hospital e assistência médica. Muita gente acha que o SUS só acontece nos hospitais de emergência, naquelas filas difíceis de serem ultrapassadas, mas o SUS é muito mais que isso e saúde também”, afirmou. O processo de fazer saúde passa pela busca das melhores soluções que a nossa inteligência cooperativa pode promover para gerar um ambiente saudável, sustentável e solidário, segundo Wagner. “A Fiocruz faz parte do SUS e é por isso que estamos aqui, conectando a saúde a todas as políticas públicas e levando o SUS para o campo, a periferia e todos que precisam ter uma qualidade de vida melhor. Essa Mostra tem o caráter de trazer a público aquilo que se faz no campo e que contribui efetivamente para a saúde”, destacou.

 

A programação presencial da Feira de Soluções para a Saúde foi realizada em Natal (RN) e integrou a I Feira Nordestina da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Fenafes). Para a pesquisadora da Fiocruz Brasília Socorro Souza, a Fundação, uma instituição de ciência, tecnologia e inovação em saúde, participar da Feira Nordestina é importante para a compreensão do lugar da agricultura familiar na promoção da vida, da saúde e do desenvolvimento regional. Confira a gravação do segundo dia da Mostra  no Youtube da Fiocruz Brasília.

 

Para acompanhar a cobertura completa da 5ª Feira de Soluções para a Saúde, clique aqui.