Será que as melhores equipes de saúde do SUS recebem mais verba? Quais os critérios dos municípios na alocação dos recursos adicionais enviados pelo Ministério da Saúde, a partir do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ)? Essas são algumas das inquietações de um grupo colaborativo de pesquisadores que se reúne de hoje, 25, até sexta-feira, 28, em oficina na Fiocruz Brasília. A instituição, por meio do Colaboratório de Ciência, Tecnologia e Sociedade, é uma das responsáveis pela pesquisa que vai analisar o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ) em perspectiva ainda inédita na literatura científica. Os pesquisadores vão verificar como o PMAQ afetou as iniquidades socioeconômicas no nível do financiamento e na prestação de serviços na atenção básica, no SUS.
Serão descritos os diferentes desenhos e arranjos municipais de investimento dos recursos do PMAQ e verificados se essas variações influenciam a qualidade do cuidado, entre outras variáveis.
Além da Fiocruz Brasília, o estudo multicêntrico envolve pesquisadores e estudantes da London School Of Hygiene and Tropical Medicine, Universidade Federal da Paraíba, Fiocruz Pernambuco, Universidade Federal de Pernambuco, Universidade Federal de Campina Grande e Universidade de Brasília. Com esta primeira oficina, os pesquisadores visaram balizar o conhecimento sobre o tema e ajustar os objetivos, métodos e desenhos do estudo, bem como discutir métodos, estudo piloto a ser realizado na Paraíba, entre outros.
Os pesquisadores vão examinar os fatores associados à adoção de diferentes arranjos na alocação dos recursos do PMAQ nos municípios brasileiros. Os dados serão coletados inicialmente em fontes secundárias, como o Censo 2010 e o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), além de outros sistemas de informação online do Ministério da Saúde. Também está prevista coleta de dados primários em desenho qualitativo da pesquisa, com entrevistas a gestores e trabalhadores do SUS de municípios selecionados, verificando quais as vantagens e desvantagens dos arranjos municipais na alocação de recursos do PMAQ.
O pesquisador da Fiocruz Brasília, Jorge Barreto, é um dos coordenadores da pesquisa e explica que, quando o gestor municipal recebe o recurso adicional devido às metas atingidas no PMAQ, ele tem autonomia para administrar esse recurso, não sendo necessário vinculá-lo à equipe analisada. Segundo ele, há efeitos benéficos como o maior incremento e maior valorização dos profissionais que foram inseridos, mas esta autonomia também pode gerar efeitos adversos, como a desmotivação das equipes que não atingem os indicadores de resultados estabelecidos, e até fraudes na avaliação. Ele compartilha a coordenação do projeto com o pesquisador da UnB, Everton Nunes.
O Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ) existe desde 2011 para incentivar os gestores e equipes de saúde a melhorar a qualidade do SUS. Por meio do PMAQ, os municípios podem receber recursos adicionais a partir da melhoria no padrão de qualidade do atendimento. O Programa pode ser considerado como esquema de pagamento por desempenho (na literatura científica, conhecido como P4P) e já existem diversos estudos descritivos sobre o programa, mas há uma lacuna nas investigações quando o tema é avaliação de impacto. Não há estudo que analise como esse desenho de incentivo financeiro afeta as desigualdades socioeconômicas no financiamento e na prestação de cuidado, nem como os diferentes desenhos afetam esse resultado.
O pesquisador da London School Timothy Powell – Jackson, pela primeira vez no Brasil, ressaltou que há pouca literatura em língua inglesa sobre o PMAQ, reforçando a importância desta iniciativa. Segundo ele, o PMAQ é singular pois os pagamentos aos municípios são feitos baseados no desempenho das equipes de saúde, porém sem alocar o recurso diretamente para a equipe, e sim conforme a vontade política do gestor. “É uma importante oportunidade de se estudar os efeitos potenciais desse desenho de incentivos e suas consequências na equidade”.
A oficina do grupo colaborativo de pesquisadores vai até sexta-feira e deve ocorrer presencialmente pelo menos uma vez por semestre. Esta investigação tem recursos conquistados pelos pesquisadores em edital do Medical Research Council, no Reino Unido, em parceria com o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa, no contexto do Fundo Newton.