Fiocruz Brasília realiza seminário internacional sobre o cuidado integral das crianças com transtorno de neurodesenvolvimento

Fiocruz Brasília 20 de março de 2018


Os cuidadores de crianças com transtorno de neurodesenvolvimento também apresentam problemas de saúde físicos, mentais, emocionais, além de problemas econômicos. É o que indica resultado preliminar de pesquisa apresentada pela coordenadora de Programas e Projetos da Fiocruz Brasília (CPP), Flávia Elias, no Seminário Internacional “Auxiliando profissionais da saúde a prover o cuidado integral de criança com transtorno de neurodesenvolvimento”. O encontro reuniu, nesta segunda-feira (19/3), pesquisadores da Fiocruz Brasília, Ministério da Saúde, London School of Hygiene and Tropical Medicine e Fundo Newton.

Enxaquecas, dores nas costas e nos ombros, elevado nível de estresse, sentimento de isolamento, cansaço, sobrecarga de trabalho, além de problemas econômicos, estão entre as situações decorrentes do fato de o cuidador passar a ter restrição de funções devido ao tempo que dedica a atender as crianças. Os dados, ainda preliminares, são de uma revisão sistemática que busca responder quais as necessidades dos cuidadores da família e cuidadores de crianças de 0 a 12 anos com transtornos, identificados em nove bases de dados, somando um total de 768 artigos. Para os estudos, foram selecionados 27.

Hannah Kuper, da London School of Hygiene and Tropical Medicine, relatou que pesquisa qualitativa realizada em Recife (PE) e Rio de Janeiro (RJ) mostra que muitas das mães cuidadoras viveram um contexto de violência familiar e foram abandonadas pelos maridos após o nascimento de criança com microcefalia em decorrência da zika. Observou que todas relataram problemas psicológicos como ansiedade, estresse, rejeição familiar, além de dificuldades econômicas, pois não podem trabalhar.   

Outra etapa da pesquisa, apresentada pela coordenadora do projeto, Luciana Sepúlveda, envolvendo entrevistas com profissionais de saúde apontou dificuldades enfrentadas na comunicação com as famílias, no lidar com a aflição materna, no lidar com a resistência do pai, a falta de recursos humanos e materiais, a lotação das unidades de saúde, a falta de espaço para o tratamento e a falta de incentivo e apoio. 

Os resultados são preliminares e as entrevistas envolveram médicos, fisioterapeutas, nutricionistas, fonoaudiólogos e professores, além de visitas e entrevistas com especialistas-chave do Brasil e de outros países. A pesquisa quer identificar como os profissionais percebem o seu papel no cuidado a estas crianças e suas famílias e o que necessitam para facilitar este trabalho. A porta de entrada foi o Hospital Regional de Ceilândia (HRC). Além das entrevistas, foi feita revisão sistemática de artigos sobre educação continuada e permanente. Foram identificados 14 estudos que abordam ações educativa à distância, entre eles checklists, coaching e textos e vídeos.

Apoio ao cuidado integral às crianças de 0 a 12 anos com transtornos de neurodesenvolvimento, suas famílias e cuidadores, acesso aos direitos, dimensão humana do cuidado e visão integrada e integral do paciente e das famílias foram temas destacados durante o seminário. “O projeto busca centrar o olhar na situação das mulheres mães de crianças com SCZ e dos profissionais de saúde”, afirmou Luciana Sepúlveda, coordenadora do projeto e diretora da Escola Fiocruz de Governo.

A pesquisadora ressaltou a importância de uma pesquisa engajada por problemas sociais e reais das pessoas nos seus territórios. “Um trabalho que responda às demandas da sociedade, na escuta e troca com as pessoas. É uma experiência muito enriquecedora”, completou. 

Os representantes do Ministério da Saúde Claudia Puerari e Danilo Campos, do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas da Secretaria de Assistência à Saúde, contextualizaram o processo de criação das leis e normas que asseguram os direitos da criança à saúde e nomearam medidas que vem sendo adotadas pelo Ministério.

Projeto
O objetivo do projeto é desenvolver recurso de educação online de acesso aberto para melhorar práticas cotidianas de profissionais de saúde, serviço social e educação para o cuidado da criança com SCZ. Para isso, busca traçar o perfil dos profissionais que trabalham na área, além de entender como os profissionais de fato podem ajudar no cuidado e acolhimento das crianças, como eles buscam a formação, como percebem o trabalho e quais as dificuldades enfrentadas. 

O projeto é realizado em rede de colaboração e conta com o apoio do Fundo Newton e a participação de diferentes unidades da Fiocruz, do Hospital da Criança de Brasília, da Fepecs, do Fundo de População das Nações das Nações Unidas (UNFPA), da London School Hygiene and Tropical Medicine e da Secretaria de Estado de Saúde do GDF. Foi criado depois da epidemia de zika, em 2015, e da confirmação de casos de microcefalia e bebês com deficiências graves. 

Flávia explica que, além de recursos educacionais abertos, a pesquisa busca trazer para os gestores, os elementos de funcionamento da rede de atenção e cuidado para os bebês e as família e entendimento da relação entre as equipes. “Na medida em que a pesquisa vai se desenvolvendo, a equipe pretende realizar novos materiais devolutivos. É uma janela de possibilidades que pode evoluir para outras ações”, afirmou.  

O painel antecedeu oficinas que foram ministradas para profissionais da saúde e integrantes do projeto. 

Fundo Newton
O Fundo Newton é um programa do governo britânico que tem como objetivo fomentar ações de desenvolvimento social e econômico por meio da ciência e tecnologia. “O que a gente faz em todas as verticais que a gente trabalha, mudanças climáticas, biodiversidade, questões urbanas e questões de saúde pública, temáticas do sistema único de saúde e doenças negligenciadas, é permitir que a troca, escuta e engajamento entre os pesquisadores brasileiros e britânicos fomentem soluções que alimentem as políticas públicas e que alimentem a sociedade nessa troca”, explicou a gerente do Fundo Newton, Mariana Veigas. 

Para ela, o projeto realizado pela Fiocruz simboliza a essência do Fundo: o diálogo. Mariana espera que a troca entre profissionais de saúde e pesquisadores seja levada adiante, não só no cunho científico, mas no âmbito humano.