O dia 18 de maio é lembrado pela Luta Antimanicomial, um marco na ampliação dos direitos de pessoas com sofrimento mental, para que possam viver em sociedade, receber cuidado e tratamento em liberdade. A data foi marcada pela formalização do projeto Supervisão Clínico-Institucional para a Rede de Saúde Mental do Distrito Federal, fruto de parceria entre a Fiocruz Brasília e a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF). O convênio, assinado nesta quarta-feira (18/5) durante evento promovido pela Secretaria, busca a qualificação da atenção em saúde mental e o fortalecimento da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) e no contexto do enfrentamento da emergência em saúde pública decorrente da Covid-19.
O projeto propõe a oferta de supervisão clínico-institucional, considerando o serviço, a rede, a gestão e a política pública, com base em casos e situações vividas no cotidiano do cuidado. A supervisão será realizada quinzenalmente por profissionais externos ao quadro de profissionais dos 18 CAPS do DF, de forma regular e integrada com a rotina das equipes de assistência e gestão.
Serão realizadas ações educativas em serviço a partir das necessidades identificadas durante as supervisões das equipes, buscando a qualificação e a mudança de práticas, com foco no território e no estímulo à autonomia e ao protagonismo dos usuários. A estratégia da supervisão utilizará metodologias participativas que propiciem integração, inclusão, empoderamento, colaboração e autonomia junto aos trabalhadores, usuários e familiares.
Para a diretora da Fiocruz Brasília, Fabiana Damásio, os esforços precisam ser redobrados nesse momento de emergência em saúde pública, em que as consequências psicológicas atingem um maior número de pessoas e por muito mais tempo. Segundo a diretora, o convênio reitera ainda mais o compromisso da instituição com a Luta Antimanicomial, que há mais de 35 anos vem estabelecendo marcos importantes, além de reafirmar a necessidade de construção coletiva de contextos de trabalho e ofertas de cuidado com dignidade para trabalhadores e usuários.
Fabiana acredita que ainda é necessário um conjunto de esforços para o avanço na agenda de cuidado em saúde mental, que fortaleça e garanta um espaço de promoção de saúde e cidadania para toda a população do DF. “Ainda há necessidade de construir muitas pontes, reconhecendo o papel da gestão, dos trabalhadores, dos usuários, da sociedade e da academia para uma prática sistêmica cuidadosa, acolhedora, amorosa e de respeito. Vamos seguir juntos plantando sementes para fortalecer a agenda da saúde mental no Distrito Federal”, ressaltou.
A coordenadora de Atenção Secundária e Integração de Serviço, Pollyanna Mertes, representante da SES-DF na assinatura do convênio, espera que a parceria auxilie os servidores de todos os CAPS a repensarem a prática clínica e o modo de cuidar da população, refletindo assim na melhoria do atendimento ao usuário.
O Núcleo de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas (Nusmad) da Fiocruz Brasília vai orientar os supervisores nos diagnósticos dos serviços, além de atuar na condução metodológica, nas formações e na organização das ações previstas de divulgação científica, incluindo a realização de fóruns de práticas inovadoras em saúde mental no contexto da pandemia.
A expectativa é que o projeto possa facilitar e transformar o trabalho dos profissionais, neutralizando os efeitos da fragmentação e das especialidades, e contribuindo com a qualificação e potencialização das ações da rede assistencial em saúde mental. O objetivo é que a transformação das práticas e do modo de fazer o cuidado nos serviços possa ser vista na prática, com reflexos positivos na vida dos usuários.
A melhoria da rede de atenção psicossocial, o atendimento aos usuários e as condições de trabalho dos profissionais de saúde mental foram temas destacados pelos representantes da SES-DF que participaram da abertura do evento. O coordenador de Atenção Primária à Saúde, Fernando Erick Damasceno Moreira, destacou que todos os pontos do sistema de saúde que acolhem as pessoas precisam de qualificação para o atendimento à saúde mental. “Qualificar a rede é cuidar melhor, estruturá-la para que possa responder de forma mais articulada e integrada com as 176 UBS e os 18 CAPS”, disse. Outro desafio destacado por Fernando é o rápido crescimento da população do DF e das regiões de vulnerabilidade, distantes dos equipamentos de saúde. Ele ressaltou ainda a importância da valorização do trabalho em equipe, multiprofissional, comunitário e com participação social. “Pensar a rede de saúde mental do DF é uma necessidade que vai aumentar a qualidade dos serviços”, afirmou.
Saúde mental da população e dos profissionais de saúde
Durante a abertura do evento, o secretário de Saúde do DF, Manoel Luiz Narvaz Pafiadache, ressaltou que o movimento antimanicomial faz lembrar que, como todos e todas, as pessoas em sofrimento mental têm o direito fundamental à liberdade e o direito de receber cuidado e tratamento sem abrir mão do seu lugar de cidadãs. O secretário também falou sobre os impactos da pandemia na saúde mental da população, provocados por medo, preocupação, estresse, isolamento e afastamento do convívio social. “Tivemos um aumento das demandas de saúde mental nesse momento”, destacou.
José Alves Ribeiro, representante dos usuários da saúde mental, mostrou preocupação com os profissionais de saúde. Para ele, os trabalhadores estão sacrificados. “Olhem com carinho para os profissionais de saúde para que eles se sintam confortáveis para atender a gente. Não adianta eu chegar ao serviço de saúde mental e ter um doente para cuidar de mim. É impossível um doente cuidar de outro doente”, afirmou. Ele destacou ainda a importância da representatividade dos pacientes, já que, por muito tempo, lutaram por espaços para discutir de igual para igual. “Precisamos de pessoas na saúde que consigam olhar para a gente e não apenas para o que a gente tem”, finalizou.
Outros participantes do evento foram o secretário-adjunto de Assistência à Saúde, Pedro Zancanaro; o subsecretário de Atenção Integral à Saúde, Oronides Urbano Filho; a coordenadora da Atenção Especializada em Saúde, Camila Gaspar; a gerente de Serviços de Psicologia, Rúbia Siqueira; e a gerente substituta de Serviços de Saúde Mental, Brenda Ferreira de Abreu. O evento contou com palestra sobre saúde mental na perspectiva psicossocial, ministrada pela professora Maria Aparecida Gussi, da Universidade de Brasília (UnB).