Fala aê, mestre: uma análise sobre saneamento, saúde e a ausência de soluções sanitárias em áreas rurais

Fernando Pinto 26 de março de 2021


Egressa do Mestrado Profissional em Políticas Públicas em Saúde da Fiocruz Brasília, a sanitarista e especialista em saúde coletiva Waleska Gouveia estudou as carências sanitárias e a Avaliação de Impacto à Saúde (AIS) em áreas rurais, que, historicamente, apresentam maior escassez de saneamento. De acordo com a pesquisadora, no contexto atual, pode-se observar que a pandemia da Covid-19 afetou ainda mais os territórios, acentuando as desigualdades.

 

Outro problema, segundo Waleska, foi à sanção da Lei 14.026/2020, que favorece a desestatização e a privatização do setor, com impacto direto sobre o direito ao saneamento. Ainda segundo ela, nessa perspectiva, alguns estudos já revelam que, quanto mais direitos negligenciados e mais pobre a população, maior o risco de adoecer e morrer de Covid-19. “Lamentavelmente, nos lugares com os piores indicadores de desenvolvimento e equidade social, também se encontram os piores indicadores de saneamento e saúde”, declarou.

 

Nessa entrevista do “Fala aê, mestre”, a pesquisadora comenta os avanços na discussão sobre saneamento e saúde para a compreensão de problemas que vêm determinando a ausência de soluções adequadas de saneamento básico, sobretudo do saneamento rural. Ela mostra também como a AIS pode contribuir na implementação do Programa Saneamento Brasil Rural (PSBR), apresentando uma análise na comunidade quilombola de Bananeiras, vila pesqueira situada na Ilha de Maré, em Salvador (BA).

 

O que é a Avaliação de Impacto à Saúde (AIS)?

Waleska Gouveia: A metodologia de AIS, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), é uma combinação de procedimentos, métodos e ferramentas que permitem avaliar uma proposta de política, plano ou programa quanto aos seus potenciais impactos à saúde, bem como a ocorrência de seus efeitos na população. É uma metodologia reconhecida por seu caráter preditivo, multidisciplinar, intersetorial, participativo e sistematizado, baseado em evidências, cujas análises têm foco na promoção da saúde, na prevenção de danos, na consolidação e no fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS), e na redução das desigualdades e iniquidades sociais.

 

Quais os impactos do avanço da pandemia da Covid-19 nas comunidades rurais?

Waleska Gouveia: Uma barreira sanitária fundamental, que prejudica o controle da pandemia, é a falta de acesso à água e ao saneamento. Minha dissertação, embora não aprofunde a discussão sobre a Covid-19, busca compreender por que, nos lugares com piores indicadores de desenvolvimento e iniquidade social, também se encontram os piores indicadores de saneamento e saúde, o que afeta diretamente a população neste momento de pandemia pelo vírus Sars-COV-2.

 

Na comunidade de Bananeiras, quais medidas de enfrentamento são necessárias diante do cenário da pandemia?

Waleska Gouveia: Diante desse cenário, e com o olhar voltado para o SUS, para a análise e avaliação de políticas públicas em saúde, para a vigilância em saúde, para a promoção da saúde e para a justiça social, especialmente entre as populações do campo, das florestas e das águas, é fundamental identificar os processos socioambientais  geradores das situações de exposição humana nas comunidades, analisando-os em função do contexto social e ambiental local, para subsidiar as decisões e ações na pauta da saúde pública e das instituições públicas de pesquisa, bem como na agenda da sustentabilidade.

 

A partir do seu estudo, o que você constatou?

Waleska Gouveia: A dissertação abordou aspectos do saneamento ambiental, ampliando o contexto do saneamento básico, com o intuído de propor a aplicação da AIS como ferramenta para a implementação do Programa Saneamento Brasil Rural (PSBR) na comunidade de Bananeiras. A partir dessa metodologia, foi possível identificar os principais impactos potenciais à saúde relacionados às discordâncias entre o PSBR e o novo marco legal do saneamento (Lei 14.026/2020). A nova Lei, votada durante a pandemia, apesar de ter recebido negativas em dois momentos anteriores, é mais um dos itens que aumentam a desestruturação do Estado. Por meio do estudo, comprovou-se um padrão de iniquidades e discriminação no acesso aos serviços de saneamento, o que negligencia, inclusive, os acordos já assumidos a respeito da universalização do direito humana à água.

 

Waleska Coelho Sajnovisch de Gouveia é autora da dissertação “Avaliação de Impacto à Saúde (AIS): um instrumento para análise do Programa Saneamento Brasil Rural em uma comunidade quilombola na ilha de Maré – Salvador/Bahia”, defendida em 12 de novembro de 2020, com orientação do professor André Luiz Dutra Fenner. 

 

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