Antirracismo: ação para transformação

Nathállia Gameiro 26 de agosto de 2020


Roda de Conversa Virtual da Fiocruz Brasília promovida na última terça-feira (25/8) abordou a educação antirracista, com a comunicadora Deh Bastos

 

Nayane Taniguchi

 

“Que mundo estamos deixando para as nossas crianças?” A partir desta reflexão, intensificada com a chegada do filho José, a comunicadora Deh Bastos, promotora de comunicação antirracista, defende que só a partir da ação, do diálogo e de questionamentos, é possível promover mudanças na sociedade brasileira, em que “ou se é prejudicado ou beneficiado pelo racismo estrutural”. Na última terça-feira (25/8), Deh foi a convidada da Roda de Conversa Virtual “Educação Antirracista”, promovida pela Fiocruz Brasília, por meio dos projetos Conviver: 365 Dias de Consciência Negra e Vivenciando a Maternidade no Trabalho.

 

A luta de Deh se tornou em ofício. Atualmente, além de ministrar cursos e consultorias voltadas à educação antirracista, ela administra o perfil @criandocriancaspretas, com mais de 75,3 mil seguidores no Instagram. De acordo com a comunicadora, entender o cenário do racismo brasileiro é fundamental para promover uma educação antirracista. “Para criar crianças antirracistas, é necessário ser antirracista, e para ser antirracista é necessário entender como é o contexto do racismo no nosso país”, explicou.

 

Agir, dialogar, questionar, investir e garantir oportunidades efetivas para as pessoas negras, seja nas escolas, nas instituições, no mercado de trabalho, do pequeno comércio às grandes corporações. Para Deh, é preciso ser antirracista, e a ação é a base para isso. “Temos que dialogar, questionar os espaços, investir o dinheiro de uma sociedade capitalista em pessoas pretas”, disse. A comunicadora acredita que as mudanças não virão em pouco tempo, mas que devem ser buscadas considerando, também, as crianças, para interromper a perpetuação do racismo nas próximas gerações.

 

Deh defendeu ser necessário um nivelamento sobre as questões do racismo e que a internet promoveu o esvaziamento de conceitos importantes que tratam das iniciativas do extermínio da população negra, como o embranquecimento da população a partir do incentivo à migração do povo europeu ao Brasil na segunda metade do século XIX, e o mito da democracia racial. Ela acrescenta que nada no Brasil aconteceu por acaso, e que, por isso, é tão importante entender como essa estrutura se deu no país. “Para mim, o maior desafio do racismo no Brasil é a negação. As pessoas acham que o racismo é a manifestação do ódio, mas a expressão do ódio é só a ponta do iceberg”, ressaltou.

 

A comunicadora ainda alertou para a importância de não comparar a situação da população negra do Brasil com a de outros países, e que o racismo pode ser manifestado, inclusive, no silêncio. “Às vezes o racismo está em uma pausa, em uma respiração ou até em uma brincadeira. Se aquela situação te magoou, machucou, doeu, é racismo. Muitas vezes a criança não expressa, mas tem o comportamento de quem sofreu racismo”, disse.

 

Ao fazer duras críticas ao racismo institucional e a falta de políticas e ações que efetivamente possibilitem a inserção da população negra a espaços ocupados majoritariamente por não negros, e que atingem desde pequenos comércios até os três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário, Deh falou ainda sobre as escolas como parte do racismo institucional, em situações nas quais se omite a real história da população negra no país, sobre como o racismo influencia a estrutura da sociedade, entre outras. “A escola ensina as crianças a serem racistas desde muito pequenininhas, nas coisas não ditas. As crianças precisam de uma educação antirracista urgente, para não serem racistas”, enfatizou. Para mudar esses espaços, Deh diz ser necessário cobrar a diversidade no ambiente escolar, que a verdadeira história do país seja ensinada, que haja diversidade na composição da equipe e no material didático utilizado.

 

Conforme a comunicadora, o racismo é um sistema político de poder e de opressão. “Somos pautados na não liberdade e o que queremos é ser livres. Não termos a liberdade de ser quem somos. A maior crueldade do racismo é não possibilitar às crianças serem quem são. Queremos a liberdade de ser, e ser quem a gente quiser”.