Da assessoria à redação: os desafios de fazer jornalismo numa pandemia

Fernanda Marques 11 de novembro de 2022


Era janeiro de 2020 e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) realizava uma coletiva para anunciar as primeiras medidas em relação ao novo coronavírus. Logo depois entrava no ar uma página com informações sobre a Covid-19. O que veio em seguida foi um intenso trabalho de assessoria de comunicação pautado pelo diálogo e a responsabilidade social. Essa experiência foi apresentada nesta quarta-feira (9/11) pela assessora-chefe de comunicação da Anvisa, Isabel Mendes, durante o III Seminário Internacional e VII Seminário Nacional As Relações da Saúde Pública com a Imprensa.

 

Enquanto Isabel trouxe a perspectiva da assessoria, Carmem Sousa, jornalista do Correio Braziliense, apresentou o olhar da redação. A mesa contou com a moderação de Raquel Aguiar, coordenadora do Departamento de Jornalismo e Comunicação do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz).

 

Isabel falou da expectativa em torno das vacinas e das reações da opinião pública diante de episódios como a interrupção técnica dos testes da Coronavac, em novembro de 2020, a aprovação para uso emergencial da Coronavac e da AstraZeneca, em janeiro de 2021, e a reprovação da Sputnik, em abril de 2021. “A nossa escolha sempre foi manter a transparência”, destacou a palestrante, sublinhando a importância das ferramentas digitais.

 

Ela citou não só a produção e divulgação frequente de notas técnicas, como também a estratégia de manter gráficos permanentemente atualizados mostrando o quanto a análise da documentação de uma vacina já havia avançado, bem como linhas do tempo indicando as etapas percorridas e a percorrer. “O objetivo final era que o cidadão compreendesse por que a vacina foi aprovada e por que ela é segura e eficaz”, ressaltou.

 

Isabel citou, ainda, a relação constante com a imprensa, e o atendimento às inúmeras demandas de entrevistas. Segundo ela, estratégias como diálogo próximo com as áreas técnicas, reuniões de pauta diárias e uso de listas de transmissão no WhatsApp, embora simples, foram fundamentais nesse processo. “A comunicação conquistou um espaço em que ela participa das decisões e faz parte da liderança da Agência”, afirmou. 

 

Carmem, por sua vez, falou dos desafios da rotina diária de produzir notícias e reportagens para o jornal. “Havia uma infinidade de dúvidas, ainda sem respostas, a serem esclarecidas por fontes não tão acessíveis, como cientistas e governo, e a imprensa precisava exercer seu papel de fazer esse meio de campo”, descreveu. “A sociedade também precisava ter voz, que os impactos sofridos tivessem visibilidade e suas demandas fossem ouvidas”, acrescentou. Em resumo: existia – e ainda existe – uma demanda imensa pelo trabalho jornalístico.

 

Conforme números apresentados por Carmem, já em 2022, apesar da queda do número de casos e da forte presença de outros temas, como a guerra na Ucrânia e as Eleições, a 6ª matéria mais lida no site do Correio Braziliense é uma matéria de serviço com informações sobre a variante Ômicron, que contabiliza 5 milhões de visualizações. Em 2021, de 30 a 40% da audiência do site se referiam à Covid-19. “Além dessa dimensão quantitativa, existe o desafio de qualificar essa cobertura”, destacou.

 

Segundo a palestrante, na pandemia, não profissionais tinham acesso às notas técnicas, aos pré-prints e a uma série de outras informações que despejavam nas mídias sociais quase em tempo real. O diferencial do repórter era dar tratamento adequado aos dados e fatos, numa perspectiva crítica e analítica, considerando todo o contexto. Acontece que todo esse trabalho devia ser feito igualmente em tempo recorde, sob pressão e, muitas vezes, por jornalistas sem formação e sem experiência na cobertura de temas de ciência e saúde. “Os jornalistas foram uma categoria muito afetada pela Covid-19. Sofreram ataques, adoeceram, tiveram perdas e viram sua saúde mental prejudicada”, conclui Carmem, apontando a importância do cuidado com o outro na sua equipe de trabalho.

 

A gravação da mesa já está disponível no YouTube da Fiocruz Brasília. Assista aqui

 

A programação do Seminário segue até sexta-feira (11/11). Confira  


As fotos do evento estão disponíveis no Flickr da instituição

 

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