Direito sanitário: vacinação como bem global

Fernanda Marques 19 de maio de 2022


“Não há necessidade de vacinar todos os seus filhos, apenas aqueles que você deseja manter”. Com esta frase projetada na tela do auditório interno da Fiocruz Brasília, o sanitarista e ex-ministro da Saúde José Agenor Álvares concluiu sua Aula Magna na noite desta terça-feira (17/5). A palestra marcou o início da 10ª turma do Curso de Especialização em Direito Sanitário da Escola de Governo Fiocruz-Brasília (EGF-Brasília) e teve como tema “Vacinação como bem global e o papel do SUS”.

 

Agenor lembrou a importância de compreender o fazer saúde como um processo civilizatório, “que transforma um sujeito sem direito à cidadania em um sujeito com direito à cidadania”. Como uma política civilizatória, que respeita o direito das pessoas de serem atendidas em suas demandas, o Sistema Único de Saúde (SUS) “é uma conquista da sociedade brasileira, resultado de um amplo movimento suprapartidário político e social, de toda a sociedade civil organizada e desorganizada, talvez sobretudo desta, que não tinha canais para vocalizar suas demandas”, definiu. Ressaltou, ainda, que o SUS não foi uma concessão. “Ele foi duramente conquistado e é preciso estar vigilante para que não nos seja tirado. O SUS não é um produto acabado, e deve estar em contínuo aperfeiçoamento, assumindo e enfrentando seus problemas”, completou.

 

O palestrante debruçou-se sobre o Art. 196 da Constituição Federal, segundo o qual “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Dedicou especial atenção aos temas da igualdade e equidade. Explicou que a equidade consiste em reconhecer que sujeitos diferentes precisam de coisas diferentes e, portanto, devem receber tratamentos distintos, conforme suas respectivas necessidades. Dessa forma, “a equidade é instrumento para chegar à igualdade, a equidade é a base ética que deve guiar o processo de formulação e execução das políticas de saúde”, frisou.

 

Ao discutir a equidade do acesso às vacinas, Agenor trouxe para o debate a questão da dependência interna em relação ao mercado internacional de produtos de saúde – um antigo problema evidenciado durante a pandemia. Comentou as profundas desigualdades no cenário global, com 75% das vacinas de Covid-19 concentradas nos países mais ricos e apenas 4% da população vacinada em países como o Haiti. Cenário que, segundo o ex-ministro, reforça a importância de políticas de inclusão como o SUS, em que se destaca a história do Programa Nacional de Imunizações (PNI) e suas rotinas e campanhas de vacinação baseadas na equidade.

 

Agenor comentou, ainda, a ação dos grupos anti-vacinas, fenômeno que também já existia antes da pandemia. “Eles usaram o tempo recorde de desenvolvimento das vacinas de Covid-19 como argumento para colocar em dúvida a segurança e a eficácia da vacinação”, disse. “Mas plataformas tecnológicas até então inéditas, como as vacinas de RNA mensageiro, não significam que não havia pesquisa. Ao contrário: já havia um grande acúmulo da ciência, pesquisas avançadas, que ganharam impulso diante da necessidade premente”, avaliou, fazendo coro com o slogan #VacinaSim.

 

Sobre a Especialização em Direito Sanitário

A Aula Magna foi antecedida por uma mesa de abertura com as presenças da diretora da Fiocruz Brasília, Fabiana Damásio, e das coordenadoras do Curso, as professoras Sandra Alves e Maria Célia Delduque.

 

Coordenadora adjunta, Maria Célia lembrou que o Curso foi o primeiro ofertado pela EGF-Brasília. “Já passaram por essa Especialização muitas pessoas que abraçaram a vida acadêmica ou seguiram outras carreiras de sucesso”, disse. “O Curso oferece conhecimento e proporciona crescimento profissional, mas entre as ‘joias’ que ele oferece também estão os laços de afeto que se estabelecem”, completou Sandra, coordenadora da Especialização e do Programa de Direito Sanitário (Prodisa) da Fiocruz Brasília.

 

Fabiana saudou a 10ª turma e todo o trabalho que vem sendo desenvolvido pelo Prodisa, com seu diálogo permanente entre educação e pesquisa. Destacou, em especial, os Cadernos Ibero-Americanos de Direito Sanitário (CIADS), periódico de referência na área. “Há mais de dez anos, o CIADS tem o compromisso de levar cada vez mais longe o debate sobre questões emergentes da saúde na interface com o direito”, afirmou. “Esse trabalho é afirmação do nosso compromisso com o SUS e com as pessoas”, concluiu.

 

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