Manifesto marca encerramento de seminário sobre deficiência

Mariella de Oliveira-Costa 18 de abril de 2022


A  informação para tomada de decisão inclui dados e indicadores. Os indicadores são dados transformados em medidas que retratam uma realidade como parâmetro norteador, instrumento de gerenciamento, avaliação e planejamento de ações que permitem mudanças nos processos e resultados. Indicadores não são medidas neutras, mas submetidas a modelos de interpretação da realidade. Durante a última sessão de palestras do  1º Seminário Brasileiro sobre Avaliação Biopsicossocial da Deficiência, na tarde de 14 de abril, a pesquisadora do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde da Fiocruz, Cristina Rabelais apresentou o Projeto do Sistema Nacional de Informações sobre Deficiência (SISDEF). Essa iniciativa busca desenvolver e tornar públicos painéis de indicadores para monitoramento e análises de dados relacionados às políticas públicas das pessoas com deficiência, por meio de uma plataforma online de acesso aberto e universal (com recursos de acessibilidade). Considerando o modelo biopsicossocial da deficiência e as fontes de dados atuais, o SISDEF é um apoio para os pesquisadores analisarem quais indicadores revelam melhor as condições de vida e as necessidades das pessoas com deficiência, os efeitos das políticas públicas implementadas e o alto nível de qualidade das medidas propostas.

 

O principal desafio da equipe do SISDEF, que é  formada por mais de 20 pesquisadores, é conciliar o tempo acadêmico, mais demorado e que requer análises aprofundadas e o tempo de gestão, urgente para a tomada de decisão. O Sistema privilegia a construção coletiva e foi desenvolvido em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o  Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), o Centro Universitário Arthur de Sá Earp Neto (Unifase), a Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, a Pesquisa Nacional de Saúde e a Plataforma de Ciências de dados aplicados à Saúde. Algumas das fontes de dados usadas são o Censo Básico da Educação, o Censo Demográfico de 2010, e a Pesquisa Nacional de Saúde de 2019.  Atualmente, mais de 80 indicadores estão disponíveis e organizados por núcleos de sentido (temas e subtemas). A Plataforma prevê testes do conteúdo e apresentação por potenciais usuários, incluindo as pessoas com deficiência na elaboração, e está em fase de acreditação e aprimoramento de acessibilidade, com ênfase na tradução do conhecimento para favorecer a sua apropriação. Para conhecer o Sistema, clique aqui.

 

A avaliação biopsicossocial para ingresso no serviço público e as condições de trabalho do servidor com deficiência foram tema de outra palestra, realizada por Fernando Gaburri, do Ministério Público Federal. Ele apresentou uma série de tópicos da legislação nacional sobre essa população. Está previsto na Constituição Federal que um percentual dos cargos e empregos públicos deve ser reservado para as pessoas com deficiência. No Ministério Público, de 5 a 20 % das vagas são reservadas. Ele alertou porém que além da reserva de vagas, é importante também que haja adaptação na realização das provas e até mesmo na acessibilidade ao edital dos concursos, o que não significa tornar as questões mais fáceis, pois a pessoa com deficiência deve participar em igualdade de condições quanto ao conteúdo, à avaliação e aos critérios de aprovação, bem como com a mesma nota mínima exigida de todos os candidatos. Ele apresentou também a resolução publicada pelo Ministério Público no fim de  2021, prevendo condições especiais de trabalho, como o teletrabalho, por exemplo, para pessoas com deficiência ou doença grave.

 

Renata Tibiriçá, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo e coordenadora do Núcleo Especializado dos Direitos da Pessoa Idosa e da Pessoa com Deficiência, chamou a atenção para o fato de que o governo federal vai iniciar a implementação de um cadastro nacional de inclusão da pessoa com deficiência. Na teoria, o instrumento pode garantir o acesso dessas pessoas às políticas públicas, a partir da implementação via INSS, de um registro público eletrônico para coletar, sistematizar e disseminar informações georreferenciadas que permitam a identificação e a caracterização socioeconômica da pessoa com deficiência, bem como identificar as barreiras que impedem a realização de seus direitos. Na prática, porém, esse cadastro vai ter, segundo ela, um viés claramente médico e não biopsicossocial, que é o que tem sido discutido como urgente e necessário ao longo de todo o evento.

 

A publicitária e membro do grupo de pesquisa em comunicação, acessibilidade e vulnerabilidades Afetos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Fatine Oliveira falou sobre o papel da comunicação nos discursos sobre a deficiência. Ela criticou que as pessoas com deficiência recebem as informações pelas redes sociais e pela imprensa, que trazem exemplos de exclusão social das pessoas com deficiência a partir do momento em que não se constrói ou dá espaços de participação em filmes e novelas, por exemplo. Ela também apontou que ao mesmo tempo em que há empresas que se preocupam em construir uma cultura de inclusão no ambiente de trabalho, e apesar da política das cotas, não há comunicação interna que informe aos trabalhadores e gestores o que é trabalhar com alguém com deficiência.

 

Ao final do evento, o grupo propôs um manifesto pela plena participação das pessoas com deficiência na regulamentação da avaliação biopsicossocial, a partir das discussões realizadas ao longo dos dois dias de Seminário. A organização do evento vai receber comentários de inserção no documento, no chat da transmissão e deve enviar o texto final aos órgãos brasileiros responsáveis pelo acompanhamento da pessoa com deficiência. Também foi sugerida a realização de um congresso nacional para debate e submissão de trabalhos e relatos de experiência sobre o tema.

 

A moderação da atividade de encerramento  foi realizada por Indyara Morais, estudante de doutorado da Universidade de Brasília (UnB) e representante da Associação Brasileira de Saúde Coletiva. O evento contou com mais de 850 inscrições e mais de sete mil visualizações durante a transmissão do evento pelo canal da Fiocruz Brasília no Youtube.

 

Clique aqui para saber como foi a abertura e visualizar os links de acesso a  todas as gravações.

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