Mudanças Climáticas e Saúde: Fiocruz no 25º FICA

Fiocruz Brasília 21 de junho de 2024


Por Gabriel Maia / PSAT / Fiocruz Brasília 

 

Na última sexta-feira (14/6), a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) marcou presença no 25º Festival Internacional de Cinema Ambiental (FICA), realizado na cidade de Goiás. Os pesquisadores da Fiocruz, Denise Oliveira e Silva, Guilherme Franco Netto e Renata Gracie participaram do painel “Mudança do Clima e Saúde: Desafios e Oportunidades em Tecnologia e Inovação”. Realizado no Fórum de Meio Ambiente, o evento trouxe reflexões sobre os impactos ambientais e suas repercussões na saúde pública, reunindo especialistas em saúde e ambiente para discutir a interseção entre mudanças climáticas e saúde.

 

O painel contou também com a presença de Priscila Valverde, da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO) e Carlos Nobre, do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP). Marcaram presença ainda no evento representantes da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde (VPAAPS) da Fiocruz, e dos Programas de Promoção da Saúde, Ambiente e Trabalho (PSAT), e Alimentação, Nutrição e Cultura (PALIN) da Fiocruz Brasília.

 

Soberania Alimentar e Vulnerabilidades Socioambientais 

A vice-diretora da Fiocruz Brasília e coordenadora do Palin, Denise Oliveira, abordou a relação entre mudanças climáticas e segurança alimentar. Ela contribuiu para a reflexão acerca do modelo civilizatório baseado em combustíveis fósseis e a produção de mercadorias, que intensificam os problemas ambientais e a fome no mundo. 

 

A pesquisadora em saúde pública destacou o impacto negativo do aumento da produção de grãos e a diminuição de alimentos in natura, essenciais para a saúde. Também ressaltou os impactos nas práticas matriarcais e a agricultura de pequenos produtores que foram substituídas por sistemas alimentares hegemônicos baseados em commodities e ração animal. “Se, por um lado se tem uma baixa de alimentos, sobretudo os mais saudáveis, em relação de alimentos in natura, nós também vamos ter as interferências disso no aumento do excesso de peso e no aumento de doenças que são relacionadas a um consumo alimentar inadequado”, aborda Denise. 

 

“É necessário informar não só sobre todo o processo que sucedeu ao desequilíbrio ambiental, mas preparar as comunidades para que possam lidar com isso, sobretudo negros, quilombolas, indígenas e pobres”, atenta a pesquisadora. 

 

Compromisso da Fiocruz com a Saúde Pública e a Proteção Ambiental 

Guilherme Franco Netto, coordenador do Programa Institucional de Saúde, Ambiente e Sustentabilidade da Fiocruz, destacou o compromisso da instituição com a promoção da saúde pública integrada à proteção ambiental. Um dos desafios destacados é a vulnerabilidade de algumas parcelas da população brasileira, especialmente comunidades originárias e tradicionais que estão fora do alcance do Sistema Único de Saúde (SUS).  

 

Para o pesquisador, há a necessidade de uma maior integração entre saúde pública e saúde ambiental a partir de políticas de saúde que considerem os impactos ambientais e trabalhem para mitigar os efeitos das mudanças climáticas sobre a saúde da população. 

 

 

Impactos Climáticos na Saúde Pública 

Renata Gracie, do Observatório de Clima e Saúde da Fiocruz, apresentou dados alarmantes sobre os efeitos diretos e indiretos das mudanças climáticas na saúde. Ondas de calor, inundações e estiagens são alguns dos eventos que já afetam a população e vitimam, principalmente, crianças e idosos. 

 

A abordagem para a tomada de decisões deve equilibrar otimismo e pessimismo para gerar políticas públicas adequadas e destacou que um dos principais problemas na abordagem das mudanças climáticas e do aumento das temperaturas médias é a desinformação.  

 

Renata diz que “os eventos estão acontecendo com maior intensidade e menor intervalo de tempo, gerando pressão no SUS e dificultando seu funcionamento”. Ela identifica uma sinergia de eventos, como o aumento da irradiação solar e da temperatura, a ocorrência de ondas de calor, o rápido secamento do material orgânico, o desmatamento e a degradação, e a vulnerabilidade para queimadas são alguns exemplos. 

 

Saúde, Tecnologia e Inovação diante das Mudanças Climáticas 

Priscila Valverde, da PUC Goiás, destacou que as mudanças climáticas aumentam a incidência de várias doenças, incluindo arboviroses, doenças cardiovasculares, pulmonares, renais, infecciosas e parasitárias, além de esquistossomose e diarreia. Ela mencionou que os insetos vetores dessas doenças, como mosquitos e carrapatos, se adaptam bem ao aumento da temperatura, resultando em um “aumento da resistência dos insetos e da incidência dessas doenças”, como menciona a pesquisadora. 

 

Priscila destacou diversas inovações tecnológicas, incluindo o Adapta Brasil, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), que oferece indicadores sobre recursos hídricos, segurança alimentar, chuvas, segurança energética, infraestrutura portuária, vendavais, aumento do nível do mar e saúde. Ela mencionou também um software da PUC Goiás que identifica mudanças na frequência cardíaca usando uma câmera, com precisão comparável a sensores tradicionais, mostrando seu potencial no Sistema Único de Saúde (SUS). Outro exemplo é o circuito e-Noé, com sensores submersos instalados em pontos de rios sujeitos a alagamentos. Esses sensores detectam alterações na altura da coluna d’água e captam imagens, enviando dados para a defesa civil via sinal de celular. 

 

A pesquisadora ressaltou a importância da capacitação das comunidades para o uso de tecnologias inovadoras e a imprescindibilidade de letramento técnico e científico. “Não adianta pensar em tecnologias e inovação se não houver o preparo e capacitação das comunidades para melhor entenderem essas tecnologias”, atenta. 

 

Emergência Climática e Ações Necessárias 

Carlos Nobre, cientista climático da Universidade de São Paulo (USP), reforçou a urgência de ações para conter o aquecimento global. Ele apresentou evidências de que o planeta está aquecendo progressivamente e alertou sobre os impactos devastadores das ondas de calor.   

 

Carlos trouxe alguns dados relacionados às ondas de calor, fenômeno em que temperaturas ficam pelo menos 3ºC acima da média histórica para o período, e que são particularmente mortais. No Brasil, entre 2000 e 2018, 48.000 pessoas morreram devido a ondas de calor, com os maiores aumentos observados em Belém e Manaus. Segundo o pesquisador, a grande fração das mortes relacionadas ao calor ocorreu entre pessoas idosas e crianças. 

 

Além disso, a degradação dos habitats naturais aumenta a probabilidade de spillovers zoonóticos, onde doenças passam de animais para humanos. Portanto, parar o desmatamento e o tráfico de animais silvestres é crucial para prevenir novas pandemias. “Investimentos significativos seriam necessários para conter esses problemas, mas os custos seriam muito inferiores aos danos econômicos de uma pandemia como a Covid-19”, chama a atenção o pesquisador. 

 

“A crise climática é a maior ameaça à saúde global (…) Alguém que nasceu em 2020, em um cenário com 1.5º, 20 até 30 ondas de calor e se a gente chegar a 2.5º em 2050, as populações que estão nascendo agora irão experienciar cerca de 50 ondas de calor, um enorme risco para a saúde”, alerta o cientista. Medidas como o monitoramento da qualidade do ar, fortalecimento de parcerias, inserção da saúde em todas as políticas e programas de vigilância são essenciais.  

 

A busca pela neutralidade de carbono (net zero) é fundamental, exigindo esforços alinhados com as metas do Acordo de Paris para manter o aquecimento global abaixo de 1,5ºC. Além disso, é necessário que o Brasil seja mais ambicioso em suas políticas e práticas de adaptação e resiliência, protegendo populações vulneráveis e desenvolvendo tratamentos para doenças sensíveis ao clima. A sustentabilidade, o diálogo e a eficiência são desafios cruciais para o setor da saúde. As novas gerações devem liderar a busca por trajetórias sustentáveis para o planeta, com ênfase em justiça social e climática, empoderando jovens e mulheres. 

 

O Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental, FICA 

O FICA é uma realização do Governo de Goiás, por meio da Secretaria de Estado da Cultura (Secult), em correalização com a Universidade Federal de Goiás (UFG), por meio da Fundação Rádio e Televisão Educativa (RTVE). Em sua 25° edição o FICA, um dos mais importantes festivais de cinema ambiental do mundo, abordou a temática “Tecnologia, Inovação e Mudanças Climáticas”. 

 

Saiba mais sobre o FICA. 

 

Fotos: Juliana Chagas / PSAT 

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